GAZETA
Vídeo mostra Romoaldo negociando propina
sexta-feira, 07 de outubro de 2016, 14h52
GLÁUCIO NOGUEIRA
DA REDAÇÃO
Agravação de uma reunião, feita pelo advogado Julio César Domingues Rodrigues, coloca o deputado estadual Romoaldo Júnior (PMDB) no centro do esquema que desviou quase R$ 9,5 milhões dos cofres da Assembleia Legislativa, por meio do pagamento de uma dívida que a Casa teria com o banco HSBC, em razão de empréstimos feitos por servidores. No encontro, realizado no dia 6 de maio de 2014, na sede do Centro de Processamento de Dados de Mato Grosso (Cepromat), o parlamentar cobra sua parcela pela liberação dos recursos, parte de um acordo extrajudicial firmado entre a Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) e uma instituição financeira por conta de uma dívida da década de 1990.
Segundo Rodrigues, o peemedebista exigia, por ter atuado no processo, R$ 500 mil mais 1% do total desviado, o equivalente a R$ 94 mil para seu chefe de gabinete, Francisvaldo Mendes Pacheco, o Dico, preso na última quarta-feira (5) por agentes do Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco). Rodrigues entregou, em março deste ano, três gravações aos delegados e promotores do Gaeco.
Os vídeos não mostram os rostos dos participantes dos encontros, uma vez que o dispositivo ficou no bolso do advogado, mas registra as vozes de Romoaldo, Dico, do próprio Rodrigues e do também advogado Joaquim Fábio Mielli Camargo, cuja delação poderá ser anulada pela Justiça, uma vez que ele teria omitido a participação do peemedebista nas tratativas.
Segundo o advogado, ele decidiu gravar os encontros após não ter recebido seus honorários por conta da negociação e por ser cobrado insistentemente por Romoaldo e Dico, que exigiam as partes deles no negócio. Todas as informações foram prestadas por Domingues em março deste ano, quando ele, espontaneamente, procurou os delegados e promotores do Gaeco.
CHEFE - As declarações do advogado reforçam a tese do Gaeco de que Riva era o chefe do esquema e mentor de toda a fraude. Domingues revelou que em 2012, ao procurar advogados para se associar, conheceu Mielli, que se interessou pelo fato de que ele já havia prestado assessoria a diversos políticos. Foi naquele ano que Joaquim decidiu pedir sua ajuda para resolver o processo envolvendo o banco e a ALMT.
Domingues contou que sua primeira investida ocorreu por meio do ex-genro do ex-deputado José Geraldo Riva, João Emanuel Moreira Lima. A orientação era fazer um requerimento, exigindo o triplo do valor devido, com um desconto de 10%. No entanto, embora tenha protocolado o documento, a negociação não evoluiu. Já em 2013, Domingues retorna a Cuiabá e, sabendo da possibilidade de receber um percentual da negociação, procura Francisvaldo, de quem era amigo há muitos anos, com a intenção de avançar o acordo.
À época, Romoaldo era o presidente do Legislativo, mas era Riva quem ocupava o gabinete da Presidência. Por conta desta articulação, advogado e deputado se reuniram pela primeira vez para tratar do tema. O peemedebista teria dito que o pagamento poderia ser feito, desde que houvesse viabilidade jurídica e que R$ 500 mil fossem repassados a ele, mais 1% ao seu chefe de gabinete.
Depois de alguns meses, Romoaldo afirmou que não poderia pagar a conta, porque não havia sustentação jurídica para a celebração do acordo, dizendo que só quem poderia autorizar isso era o “baixinho”, em alusão a Riva. Domingues então procurou o parlamentar e, junto com Mielli, recebeu como resposta que o pagamento poderia ser feito, desde que houvesse o pagamento de uma taxa de retorno - propina - de 50% do montante. Dias depois, o pedido foi ajustado e ficou acordado que o ex-deputado receberia 45%.
Após apresentar um parecer jurídico ao então procurador, Anderson Godoi, e sob a orientação do então secretário-geral, Luiz Márcio Pommot, o acordo foi celebrado e se decidiu que o pagamento seria quitado em três parcelas mensais, sendo que do montante, Riva ficaria com 45%. O primeiro pagamento foi feito em fevereiro de 2014. Domingues então procurou Pommot para saber como se daria o retorno da quantia devida a Riva.
PROBLEMAS - Ao se reunir com o então secretário-geral, o advogado foi surpreendido com a presença de Francisvaldo, que exigia o pagamento dos R$ 500 mil devidos a Romoaldo e de sua parte na transação, 1%. Depois de discutirem rispidamente, com a ameaça feita por Dico de suspender os pagamentos, ficou acertado que a parte do peemedebista seria paga ao final da última parcela.
Depois da quitação da segunda parte da dívida, Domingues estava em um shopping da cidade quando, segundo ele, foi abordado por Romoaldo. “Cadê o meu dinheiro, p***a”, teria dito o parlamentar. Domingues resolveu informar Mielli sobre este pagamento e recebeu como resposta do advogado que ele só quitaria a parte devida a Riva. Em abril, o acordo foi quitado e os advogados finalizaram os repasses a Riva, sem que houvesse o pagamento a Romoaldo e Francisvaldo.
REUNIÕES - Sem ter recebido toda sua parte no esquema e diante das cobranças insistentes, Domingues decidiu gravar as reuniões que teria para tratar do assunto, sobretudo após Mielli ter afirmado que a questão com o peemedebista deveria ser resolvida por ele. Ao final da reunião, Domingues disse que não iria pagá-lo, para que Francisvaldo cobrasse de Romoaldo, já que Riva teria dito que a maior parte dos 45% tinha ido para o deputado.
Já em maio, Domingues se reuniu com Francisvaldo e Romoaldo e foi novamente cobrado acerca dos repasses. “A conta não fecha, tenho R$ 306 mil para vocês”, afirmou Domingues, conforme as gravações. Romoaldo não aceitou a proposta. “Nunca mais faço negócio com você, tá? Nunca mais faço negócio com você. Você vai procurar o José Riva e acerta com ele”, disse o parlamentar.
Domingues ainda tentou argumentar que tinha recebido menos do que o combinado e afirmou que não ficaria no prejuízo. “Eu não vou ficar no prejuízo, você que vai ver. Você não sabe o que é prejuízo, você vai ver o que é prejuízo. Prejuízo é o nome da gente”, disse o parlamentar, negando que tenha com a declaração ameaçado Domingues. Ao final do encontro, o advogado foi novamente alertado por Romoaldo. “Faz de conta que você nunca me conheceu”.
OUTRO LADO - O advogado de José Riva, Rodrigo Mudrovitsch, negou que seu cliente tenha mentido à juíza Selma Rosane Santos Arruda a respeito do caso. “As declarações e informações trazidas espontaneamente por José Riva contribuíram sobremaneira para o sucesso dessa nova fase da persecução penal. José Riva vem colaborando indistintamente com diversas investigações em curso, não possuindo qualquer intento de sonegar informações ou imputar falsamente qualquer conduta delituosa a quem sabe inocente”. O defensor destacou que o ex-deputado está à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos. A defesa de Romoaldo não foi localizada.