GAZETA
Procurador acusa governo de agir a favor de ministro
sexta-feira, 27 de janeiro de 2017, 16h02
KEKA WERNECK
DA REDAÇÃO
Em tom de denúncia, o procurador-geral de Justiça em exercício, Luiz Alberto Esteves Scaloppe, disse à imprensa nesta quinta-feira (26) que o governo do Estado vem agindo, desde o ano passado, sob pressão da Presidência da República, em favor de interesses econômicos particulares do ministro chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, e dos demais pecuaristas que “grilaram” área no Parque Estadual Serra de Ricardo Franco, em Vila Bela da Santíssima Trindade (521 km a oeste de Cuiabá), na fronteira com a Bolívia.
O procurador ressaltou que, conforme já divulgado anteriormente, tais pecuaristas, que detêm poder econômico e político, são investigados por crime ambiental, desmatamento de 19 mil hectares verificados após a criação do parque, pecuária irregular e trabalho escravo. E Scaloppe informou que recorreu na tarde de ontem da decisão judicial de dezembro que suspendeu os efeitos da liminar que obrigava o Estado de Mato Grosso a adotar providências para a efetiva regularização do Parque Estadual Serra de Ricardo Franco.
“A iniciativa privada, grileiros, invasores, vieram ao governador do Estado Pedro Taques e pediram para ele defendê-los, ou seja, o que nós estamos vendo é o Governo do Estado movendo a Procuradoria do Estado na defesa de invasores ou de ocupantes ilegais de terras, isso é muito grave, porque estamos criando um precedente muito sério. Eu não acredito que o governador tenha pensado duas vezes antes de fazer isso ou talvez a pressão do Governo Federal, na pessoa do ministro Padilha, tenha exercido uma pressão muito forte sobre o Estado de Mato Grosso por interesses particulares, porque ele (o ministro) é um desses”, vaticinou Scaloppe.
“Estou decepcionado com isso porque estão sacrificando um parque, que é um lugar sagrado para nossa vida, em troca de alguns interesses particulares que não são sérios, mas ilegais e até criminosos”. Detalhando o clima de disputa da terra, conta que sofreu ameaça de morte durante uma audiência pública, há cerca de dois anos, na qual defendeu a reserva. Disse ainda que, tanto ele quanto a promotora de Vila Bela, Regiane Soares Aguiar, que acompanha o caso pelo Ministério Público Estadual (MPE), por estarem na contramão deste jogo de influências, defendendo a preservação da reserva de inestimável valor ambiental, estão sob pressão para não endurecerem no Judiciário.
A promotora explica que a ação inicial do caso objetiva principalmente obrigar o Estado a fazer o plano de manejo, a regularização fundiária e a fiscalização do parque. Um liminar favorável foi proferida em fevereiro de 2016. O item C da liminar determina a fiscalização ostensiva para identificar as áreas degradadas e retirar o rebanho da unidade de conservação. Ano passado, cumprindo a determinação, fiscalizações resultaram em autos de infração e multas administrativas e em 50 ações.
Um dos acionados é o ministro. Em dezembro, o Judiciário determinou o bloqueio de bens dos invasores, entre eles de Padilha, na ordem de aproximadamente R$ 1 bilhão, a título de reparo dos danos ambientais, e que o Estado assumisse o controle do parque. Houve a execução da ordem. Os empresários atingidos foram ao Governo pedir apoio, sendo recebidos pelo secretário da Casa Civil, Paulo Taques. Na ocasião, de pronto, o secretário Paulo Taques sinalizou apoio.
O procurador-geral Scaloppe narra que foi aí que o Governo, após receber os “grileiros”, através da Procuradoria Geral do Estado, questionou a liminar anterior, com um pedido de suspensão de segurança, em favor dos irregulares. O pedido foi atendido pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) e eles teriam saído ilesos da situação. “E mais um detalhe, os fiscais foram afastados das atividades”.
“Considero uma indignidade o Governo do Estado de Mato Grosso agir em defesa de interesses privados em detrimento do bem público relevante que é o Parque Serra de Ricardo Franco”, ressaltou Scaloppe. “Os interesses da população devem estar acima dos interesses privados de pessoas que estão se apropriando dessas áreas de forma ilegal e criminosa.
Entraram sabendo que era um parque, jogaram e investiram e pagaram pouco acreditando que o Governo do Estado e Federal seriam omissos”, afirma o promotor. Diante deste cenário, a Procuradoria de Justiça Especializada em Defesa Ambiental e da Ordem Urbanística assumiu o caso junto com a promotora Regiane, apostando em um agravo de instrumento em favor do parque.
Na reserva de Ricardo Franco ainda há 120 propriedades espalhadas nos 150 mil hectares, localizados em território brasileiro, algumas delas instaladas antes do decreto estadual de criação do parque, em vigor desde 1997. “A criação desse parque decorreu de um compromisso internacional e foi precedida de estudos sobre a importância biológica da área”, ressalta Regiane.
OUTRO LADO - De Brasília, a Casa Civil informou que o ministro não irá se pronunciar sobre as acusações. Em nota emitida por ele em dezembro do ano passado, alegou que as acusações não procedem e que seriam contestadas no Judiciário. “Não cometi nenhum crime ambiental. Não extrai uma só árvore na propriedade em questão. Isto tudo restará provado quando da decisão final”.
Já o secretário Paulo Taques, que recebeu os pecuaristas em dezembro, alega que em 20 anos nenhum governo enfrentou esta situação. Ressaltou que as indenizações nunca foram feitas e que agora o Estado não agiu sob influência econômica ou política, mas sim na intenção de resolver o problema. “O que fizemos foi exercitar o direito inerente ao Governo Estado e não de interesse privado. Não olhamos os nomes de quem são os fazendeiros, nós olhamos o interesse público”, comentou.
Destacou a preocupação com as desapropriações e plano de manejo. “Estamos passando por um momento de grande dificuldade financeira. Uma desapropriação e um plano de manejo de uma área desse tamanho requerem milhões de reais. Por isso, pedimos apenas a suspensão dos prazos para incluirmos essa previsão no orçamento e promover essas ações”. Quanto às pressões externas e ilegalidades, disse que “nosso Governo não tem compromisso com erro e nem com desmatamento”.