Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

GAZETA

Entrevista Mauro Curvo:‘Antes que o leite derrame’

segunda-feira, 13 de março de 2017, 10h32

GLÁUCIO NOGUEIRA
DA REDAÇÃO

Empossado nesta semana como novo procurador-geral de Justiça, para o biênio 2017/2019, o procurador de Justiça Mauro Curvo anunciou que suas duas prioridades à frente do Ministério Público Estadual (MPE) serão a Saúde e o combate à corrupção e ao crime organizado. Nesta entrevista, ele detalha como pretende atuar nestas duas frentes, fala da questão dos repasses constitucionais e ainda do papel de protagonista alcançado pelo Ministério Público em todo o país por conta das diversas investigações e operações deflagradas nos últimos anos. Confira:

O senhor assume o cargo de procurador-geral no momento em que o Ministerio Público está em grande evidência no país, com diversas grandes investigações. É preciso prosseguir assim. Se sim, como manter o MPE nesta condição?

Vejo que temos que continuar a dar ênfase ao combate à corrupção e ao crime organizado. Vejo isso até com tristeza, porque o ideal seria termos um cenário com a honestidade como a regra. Se fosse desta maneira, não teríamos tantas operações, como estamos tendo por aí. Vamos enfrentar a realidade, construindo um lugar melhor para viver, na medida em que acabarmos com o sentimento de impunidade. As operações são fundamentais para demonstrar que ninguem está acima da lei, que quem desvia dinheiro público vai responder por isso. Temos que mostrar que o crime não compensa. Estas operações atingindo pessoas que se julgavam inatingíveis mostram isso para a sociedade. O crime não pode compensar.

Qual a sua ideia de fortalecimento do combate à corrupção e ao crime organizado?

A ideia se divide em três pontos. O primeiro é investir bastante no Gaeco, conseguindo levar mais um ou talvez dois promotores ao grupo. Precisamos também investir em tecnologia porque ela é facilitadora. Temos algumas tecnologias na área de investigação que podem nos ajudar. E também uma medida que não necessita tanto assim de recursos financeiros e tecnológicos que é a integração entre os órgãos de execução, entre as promotorias que atuam no Patrimônio Público e no Criminal, fazer com que os integrantes destas promotorias lembrem sempre da outra, trabalhem em conjunto, compartilhem provas. Precisamos institucionalizar esta colaboração. Isso não requer recursos financeiros ou tecnológicos, mas sim que amadureçamos a melhor forma para que isso ocorra.

Na área da Saúde, como o MPE pode ajudar sem usurpar a competência dos demais poderes?

É bom colocarmos isso, porque tudo passa pela visão do papel do MPE, que vem com viés muito demandista, até hoje, de atuar depois que ‘o leite foi derramado’. Houve o desvio e depois se corre atrás de quem desviou, de sequestrar bens e recuperar o dinheiro que foi desviado. Há uma crítica, justa, de por qual motivo não tentamos prevenir. O que estou tentando fazer é entender esta crítica e atuar no convencimento e na formulação de políticas que evitem o desvio.

Vamos começar a trabalhar na formulação de políticas que garantam o medicamento, a prestação de o serviço, para que não tenhamos que entrar com ações pedindo isso. É uma quebra de paradigma, não vai ser pouca gente que vai dizer que estamos entrando em um terreno que não é nosso. Mas entendo que a população não pode mais esperar, não tem essa de terreno que é nosso ou não. Há, sim, um desejo da sociedade que clama por uma intervenção. Por qual motivo o MPE não poderia sentar com os prefeitos, com os gestores da área e dizer ‘eu acho que se trilharmos este caminho a coisa pode melhorar’ e ouvir o que vem de lá para cá?

Na questão da compra de medicamentos unificada. De onde surgiu a ideia?

Não estamos inventando a roda. Economia de escala, trazer a racionalidade na aquisição de produtos é algo que a iniciativa privada faz há muitos anos. O que a gente quer é trazer estas boas práticas para o setor público. Esta ideia eu tive por conta de estar há 8 anos trabalhando na administração. Eu diariamente recebia aqui, enquanto secretário de Administração, pedidos de adesão às atas de registro de preços nossas, vindos do Brasil inteiro. Vamos dar um exemplo de que eu compro 300 cadeiras, faço uma ata de registro de preços.

Aí, recebo pedidos de adesões de diversas prefeituras, 20 para uma, 30 para outra. Ora, se eu soubesse que havia esta demanda, teria feito uma ata para 500 cadeiras e certamente pagaria mais barato. Levei esta ótica para dentro da saúde pública. Enquanto não sabemos qual a demanda de cadeiras, sabemos qual a demanda dos remédios de cada um dos municípios.

Podemos fazer um registro de todos estes remédios, somando os quantitativos de cada um dos municípios, até mesmo porque a ata de registro não obriga a compra. Aí fazemos um software para que os municípios comprem estes remédios, como uma prateleira virtual. Isso evita desperdício, gera economia de escala, porque cada um pagará pelo que precisa, mas com um preço menor porque a quantidade de todos os municípios é maior.

Como seria feito o controle?

Esta ideia evita a judicialização, porque não precisamos mais ajuizar ações, basta o município comprar. Facilita até para fiscalizar, porque iremos fiscalizar um pregão e não muitos pregões. Ainda não vi desvantagem nesta proposta. Isso ocorre na iniciativa privada. Hoje há muitas farmácias, por exemplo, que se unem em uma bandeira só para comprar em maior quantidade e pagar um preço menor. Aí elas usam um software de gestão que, com o cadastro dos consumidores, aponta qual é a necessidade de cada loja. Se fazem isso com objetivo de gerar lucro, porque o Poder Público não pode fazer?

Vivemos um cenário de crise, com forte queda da arrrecadação pública, que gerou inclusive um atraso em duas parcelas dos repasses constitucionais. Como garantir que mesmo com este panorama seja possível investir no MPE?

Precisamos conversam, buscar entendimento, achar consenso. Hoje a situação é a seguinte, nós não recebemos um duodécimo e uma parte de um segundo. Isso é objeto de um TAC feito com o governo e todo mundo que assinou o TAC entendeu, muito embora não tivesse escrito, que aqueles pagamentos seriam feitos com o FEX e com a repatriação. Este dinheiro demorou a chegar, chegou no apagar das luzes do ano passado, justificando não recebermos aquilo que estava acordado, da forma como estava acordado. Agora, ele entreou.

Se ele entrou, precisamos sentar para conversar porque precisamos deste dinheiro, achar um consenso que nos garanta receber o que é devido, as futuras parcelas e que o Executivo honre aquilo que for repactuado. Na hora em que repactuarmos, vamos fazer um planejamento, e não pode haver falha. Sabemos que o Brasil inteiro está em dificuldade, com estados muito piores do que nós. O pior dos cenários é colocar em risco futuros recebimentos.

Como está esta negociação? Há risco de judicialização?

Honestamente não sei, estou me inteirando disso agora que tomei posse. Mas tenho certeza de que chegaremos a um consenso. Judicializar algo é a última das alternativas. Não se pode sentar para negociar imaginando judicializar. Isso tem que ser a última opção.

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