GAZETA
Idosos não têm para onde ir
terça-feira, 23 de maio de 2017, 10h30
ALCIONE DOS ANJOS
DA REDAÇÃO
Atualmente, em Cuiabá, pelo menos 6 idosos encontram se em situação de abandono familiar e não têm para onde ir, já que o município não possui uma casa de apoio pública voltada para eles. A Fundação Abrigo Bom Jesus de Cuiabá, entidade filantrópica que poderia recebê-los, está com o convênio com a prefeitura vencido desde dezembro de 2016.
Vivem na fundação 89 idosos, desses, 40 foram encaminhados pelo município. Eles permanecem aguardando a renovação do contrato para continuar tendo os cuidados oferecidos pela casa. Situação tão complicada quanto a de idosos que dão entrada no Pronto-Socorro Municipal de Cuiabá (PSMC), recebem atendimento médico e ficam dias com alta hospitalar, mas continuam ocupando os disputados leitos da unidade por não terem para onde serem encaminhados.
Nesta segunda-feira (22), por exemplo, Marcelo Barrada, de 65 anos, teve alta. Internado desde 17 de março, ele vai continuar na unidade, pois desde que deu entrada com Acidente Vascular Cerebral (AVC), nunca teve acompanhante e não foi encontrado nenhum familiar. Um outro idoso, internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), recebeu alta, mas sem acompanhante não pode ser transferido para a enfermaria.
Outro veio encaminhado pelo município de Barra do Bugres (165 km de Cuiabá), sem família, ficou em uma das clínicas da unidade. Conhecidos deste senhor se comprometeram a acompanhá-lo, entretanto, como o paciente ficou com sequelas em decorrência também de um AVC, se recusaram a levá-lo para casa.
A assistência social do PSMC entrou em contato com o município de origem para conseguir uma vaga em alguma casa de apoio de lá. Segundo o presidente do Conselho Municipal do Idoso de Cuiabá, Jeronimo Urei, deixar idosos em porta de unidades de saúde não é um fato raro. Ele aponta que chegam de duas a três denúncias de abandono de idosos nessas unidades por dia ao conselho.
“É uma situação preocupante”, avalia Urei. “Não existe um único motivo para que isso ocorra, mas a alegação mais comum é que os familiares não têm tempo de cuidar de uma pessoa anciã que precisa de cuidados constantes”, revela. Para o Ministério Público do Estado (MPE) o problema é tão grave que a 34ª Promotoria de Justiça da Capital ingressou, em 2014, com uma ação civil pública contra o município de Cuiabá.
Na ação, o MPE pede que o Poder Judiciário obrigue a prefeitura a construir um abrigo público para o acolhimento de pessoas idosas. O processo tramita na Vara Especializada de Ação Civil Pública e Ação Popular da Capital e está na fase de alegações finais. Apesar da judicialização do caso, o MPE ainda tenta acordo com o novo prefeito de Cuiabá, Emanuel Pinheiro (PMDB), para que a unidade se torne realidade o mais rápido possível.
Sem revelar números, a promotoria descreve que o problema de abandono de idosos e maus-tratos contra eles vem aumentando consideravelmente nos últimos anos. Os 6 casos de abandono de idosos registrados em Cuiabá neste mês, apontados nesta reportagem, são acompanhados pela 34ª Promotoria, entretanto diversos outros vêm sendo investigados pelo MPE.
As duas situações encontradas no PSMC ainda não foram relatadas ao MPE. “Primeiro tentamos o contato com os familiares para restabelecer o vínculo familiar. Só em caso da família se negar a cuidar do idoso o MPE é acionado”, explica a assistente social do PSMC, Vanda Paes de Arruda, que trabalha há 39 anos na unidade.
Ela lembra que consta na Lei 10.741, o Estatuto do Idoso, que, assim como os pais têm o dever de assistir, criar e educar seus filhos enquanto são menores, é responsabilidade dos filhos ajudar e amparar os pais na velhice. “Alguns casos o familiar alega que no passado o idoso não foi presente, mas não podemos resolver o passado, temos que garantir o direito desse idoso que agora precisa de cuidados”,
comenta.
Diretor do PSMC, Alexandre Martins lembra que a unidade já recolheu idosos que foram deixados no portão do Pronto-Socorro. Ao serem abordados eles estão confusos, perdidos e com problemas de saúde. “Não temos outra alternativa. Não podemos fechar os olhos e mandá-los para outro lugar”, comenta. Ele destaca que em outro caso a família internou o idoso e só foi à unidade para pegar a aposentadoria. “Já atendemos casos de maustratos, de quebra de vínculo familiar e de total abandono”, relembra. (Leia mais na Página 2B)