STF retoma julgamento sobre quebra de sigilo telemático em investigações
quinta-feira, 25 de setembro de 2025, 12h45
O Plenário do Supremo Tribunal Federal retomou, nesta quarta-feira (24/9), o julgamento com repercussão geral (Tema 1.148) que decidirá se a Justiça pode determinar a quebra do sigilo telemático de forma não individualizada em investigações criminais. Votaram na sessão os ministros Gilmar Mendes, que havia pedido vista, e Kassio Nunes Marques.
O caso concreto é o da investigação do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL), ocorrido em 14 de março de 2018. A 4ª Vara Criminal do Rio de Janeiro determinou que o Google identificasse protocolos de internet (IPs) de dispositivos que tenham usado a plataforma para buscar termos que indicassem participação no crime.
Segundo a decisão, o Google deveria identificar pessoas que buscaram, entre os dias 10 e 14 de março daquele ano, portanto antes do crime, os termos “Marielle Franco”, “vereadora Marielle”, “agenda vereadora Marielle”, “Casa das Pretas”, “Rua dos Inválidos” e “Rua dos Inválidos número 122” — lugares onde ela esteve pouco antes da morte.
O caso foi levado ao Supremo pelo Google, que afirma que a decisão de primeira instância foi insuficientemente fundamentada. E também alega que haveria uma espécie de varredura generalizada dos históricos de pesquisa de usuários, o que representaria violação ao princípio da privacidade.
Decano da corte, Gilmar destacou a relevância e complexidade do tema, que envolve “os limites da jurisdição constitucional e do sistema de proteção dos direitos à privacidade, à inviolabilidade e à proteção de dados frente a emergência de novos fenômenos, como o constitucionalismo digital, o direito coletivo à segurança pública e o uso de novas tecnologias por parte dos órgãos e agentes de investigação”.
Em seu voto, Gilmar se posicionou pelo uso restrito da quebra de sigilo, além de propor um conjunto de regras rigorosas para sua aplicação. Ao longo de sua manifestação, o decano destacou a preocupação com a privacidade e o potencial de violação de direitos individuais que a busca reversa representa.
A técnica permite a quebra de sigilo de pessoas a partir de termos de pesquisa ou localizações, algo que, para o ministro, o STF não está preparado para regulamentar de forma ampla. Segundo Gilmar, o ideal é uma postura “minimalista” e “autorrestritiva” da corte.
Por isso, ele argumentou contra a repercussão geral da matéria e considerou adequado julgar apenas o caso específico, para que a jurisprudência se desenvolva gradualmente.
Propostas de Gilmar
Embora seja contra a repercussão geral, Gilmar fez sugestões para o caso de ficar vencido nesse ponto. Para o ministro, a busca reversa deverá ser permitida apenas em investigações de alta gravidade, como crimes hediondos, a fim de justificar a invasão de privacidade.
Além disso, a ordem judicial deve ser extremamente precisa, detalhando os indexadores e o período de tempo da busca. A medida não pode ser o primeiro ato da investigação, sendo utilizada somente quando não houver outros meios menos invasivos para obter as informações necessárias.
Por fim, Gilmar propôs que todos os dados de pessoas sem vínculo direto com a investigação sejam imediatamente descartados.
Nunes Marques
O voto do decano ocupou a maior parte da sessão desta quarta e foi seguido pela manifestação de Nunes Marques, que proferiu um voto mais sucinto e com uma posição mais conciliadora.
Segundo o magistrado, é válida a preocupação com os direitos fundamentais, mas é preciso considerar a necessidade da polícia de ter acesso a ferramentas de investigação. Ele destacou que a Constituição Federal e a Lei de Interceptação Telefônica foram construídas em ambientes “analógicos” e seria importante atualizá-las com os avanços digitais.
Além disso, o ministro afirmou que a proibição completa da busca reversa seria um excesso, já que nenhum direito é absoluto.
Votos anteriores
O Plenário está dividido sobre o tema. Primeira a votar, a relatora da matéria, ministra Rosa Weber (hoje aposentada), deu provimento ao recurso quando o caso era analisado no Plenário virtual. Para ela, não pode haver “ordem judicial genérica e não individualizada de fornecimento de registros de conexão”.
O ministro André Mendonça adotou entendimento semelhante. Ele votou no sentido de que a quebra de sigilo telemático não individualizada só pode ser autorizada com base em critérios estritos e objetivos.
Já o ministro Alexandre de Moraes abriu a divergência. Para ele, a requisição é constitucional nos casos em que há fundado indício de ocorrência de crime, justificativa motivada da utilidade dos registros solicitados e determinação do período ao qual se referem os dados. Ele foi seguido pelo ministro Cristiano Zanin.
Fonte: Conjur