Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

Ministro do STJ aplica abolitio criminis em favor de réus por fraude à licitação

sexta-feira, 03 de outubro de 2025, 07h56

O ministro Ribeiro Dantas, do Superior Tribunal de Justiça, extinguiu a punibilidade de um grupo de réus denunciados por fraude e dispensa ilegal de licitação em uma acusação decorrente da “ouvidos moucos”, deflagrada em 2017 para apurar supostos desvios de recursos na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

 

A ação policial é a mesma que, em 2017, levou à prisão temporária do então reitor da UFSC, Luiz Carlos Cancellier de Olivo. Proibido de retornar à universidade depois de ser solto, Cancellier cometeu suicídio poucos dias depois, o que provocou uma onda de repúdio aos métodos de investigação e ao abuso de autoridade no país.

 

A decisão foi baseada na aplicação da abolitio criminis. Segundo esse princípio, uma conduta não pode mais ser punida se deixar de ser considerada crime por uma lei posterior, mesmo que os fatos tenham ocorrido antes da mudança legislativa.

 

No caso dos autos, o grupo foi denunciado por supostas irregularidades em licitações da Fapeu (Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária). Segundo a acusação, esses processos licitatórios descumpriram uma legislação antiga, a Lei 8.958/1994, que obrigava as fundações de apoio a seguirem a Lei de Licitações (Lei 8.666/1993) ao usarem recursos públicos.

 

Em 2013, porém, a lei de 1994 foi revogada e substituída por outra, a Lei 12.863/2013, que determinou que as fundações de apoio passariam a adotar um regulamento específico para aquisições e contratações, não mais se submetendo diretamente à Lei de Licitações.

 

Como a norma que criminalizava a conduta deixou de ser aplicável a essas entidades, o ministro Ribeiro entendeu que não há mais base legal para processar os réus por esses delitos específicos, mas a decisão não impede que a ação penal siga normalmente em relação aos demais crimes, como peculato e organização criminosa.

 

Entenda o caso

 

Os réus foram denunciados por dispensa ilegal e fraude a licitações, entre outros crimes, em contratações de locação de veículos por meio da Fapeu, em atos ocorridos entre 2008 e 2016. A denúncia afirmava que os réus direcionavam contratos e simulavam pesquisas de preços para fraudar o caráter competitivo dos procedimentos.

 

Desde o início do processo, a defesa alegou a abolitio criminis, mas a tese foi rejeitada tanto pelo juízo de primeiro grau quanto pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. As instâncias inferiores entenderam que, mesmo com a mudança na lei, a denúncia não se baseava apenas no descumprimento da Lei de Licitações, mas em uma violação mais ampla do dever de contratar corretamente. As decisões consideraram que houve desrespeito a orientações do TCU, da CGU e do próprio manual de procedimentos da Fapeu.

 

No entanto, o ministro Ribeiro Dantas rejeitou esse entendimento, afirmando que ele viola o princípio da taxatividade penal, que exige que um crime esteja claramente descrito em lei. Segundo o relator, não é possível ampliar o alcance de um tipo penal para incluir o descumprimento de normas infralegais, como manuais ou orientações de órgãos de controle.

 

Com a revogação da norma que submetia as fundações de apoio à Lei de Licitações, a conduta deixou de ser crime. A decisão estendeu os efeitos aos corréus na mesma situação, mas o processo continua em relação aos demais crimes imputados, como peculato e organização criminosa.

 

“Quando da deflagração da operação, em 14/09/2017, essa abolitio criminis já poderia ser constatada”, afirma a defesa, que representa uma das rés. “Ainda que na instância originária o MPF já tenha requerido a absolvição da recorrente, é mais uma etapa no restabelecimento da legalidade em relação à ‘ouvidos moucos'”, conclui.

 

 

 

Fonte: Conjur

 

 

 


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