GESTÃO URBANA
Queremos sim a “copacabanização” das cidades
por Rogerio Goldfeld Cardeman
segunda-feira, 11 de abril de 2022, 13h52
Copacabana, onde as ruas dão na praia, onde as calçadas são largas e o comércio no térreo é abundante, não deve ser demonizada mas sim servir de exemplo.

Quando comecei o mestrado, em 2008, escolhi o bairro de Copacabana, no Rio de Janeiro, como objeto de estudo. Uma das motivações era saber que a literatura que citava o bairro tinha um discurso quase imaginário, um “achismo”. Não havia textos que entrassem nas questões da morfologia e da construção da sua paisagem. Em sua maioria, os livros se debruçavam somente em sua história.
Um dos “achismos” era a ocupação exacerbada, sem espaços livres, causando desconforto à população do bairro. Após levantar a área de todos os edifícios do local, considerando só os lotes privados, cheguei a uma taxa de ocupação líquida de apenas 53%. Muitos destes espaços estavam escondidos dentro das quadras. Ou seja, caía por terra um dos argumentos para desqualificar a ocupação do bairro.

Na época, conversei informalmente com diversos moradores sobre a diferença entre morar de frente ou de fundos e o que achavam do bairro. A maioria preferia morar de fundos para os espaços livres existentes, e nenhum cogitava sair do bairro. Diziam: “aqui eu tenho tudo perto, é muito confortável”.
Acreditei que tinha contribuído para melhorar o entendimento do bairro, especialmente entre a comunidade de arquitetos e urbanistas. No entanto, durante a discussão do Plano Diretor da cidade do Rio de Janeiro, neste ano de 2022, me deparei com a palavra “copacabanização”. Era a primeira vez que ouvia esse termo, e se referia a transformar partes da cidade em áreas densas e verticalizadas. Isso era dito de forma pejorativa e desqualificante em termos de modelo urbanístico.
Bom, eu afirmo que quero a “copacabanização” das cidades.
Muito se fala dentro do urbanismo sobre cidades compactas, menos dispersas, mais densas, onde podemos encontrar próximo, em um percurso relativamente curto, diversos usos como comércio e serviços, moradia e lazer. É possível chamar também de cidade de usos mistos. Sabemos que os espaços urbanos que mais reconhecemos por sua vitalidade têm esses atributos.
Onde, na cidade do Rio de Janeiro, temos estações de metrô, lazer, trabalho, comércio e moradia para diversas faixas de renda? Copacabana possui quatro estações de metrô, praças e praia, além de um uso misto rico em diversidade. Há inclusive edifícios em que parte é residência e parte é serviço, convivendo juntos sem separação de circulações — o que é proibido para novas edificações. Temos moradias de vários tipos, desde quitinetes até os grandes apartamentos, onde a população de diversas faixas de renda convive no espaço público de forma democrática.
É claro que, como todo Plano, o de Copacabana tem seus erros. O aumento do gabarito em dois pavimentos, em 1956, trouxe a sensação de enclausuramento em algumas ruas. Além disso, a não continuidade da implantação dos pavimentos térreos em pilotis atrapalhou a circulação de ar pelas quadras. Deveríamos sim cuidar melhor do bairro, que está muito maltratado, com calçadas esburacadas e sujas, e o mobiliário urbano destruído.
Mas é difícil acreditar que usem esse termo para desqualificar um espaço urbano que deveria ser exaltado. Deveríamos sim ocupar e adensar os espaços vazios que ainda existem ali, completando seu perfil edilício e sua forma urbana. Deveríamos usar o bairro de Copacabana como objeto de estudo do que deu certo e errado, e não desqualificá-lo com palavras sem sentido, sem pesquisa e sem propósito.


Fonte: Caos Planejado