LUNETAS: ECA Ambiental e a importância do verde durante a infância
quinta-feira, 23 de outubro de 2025, 17h37
Sou do tempo de brincar de canoinha nas dunas, das brincadeiras tradicionais, do anel, cai-no-poço, e muita natureza, muito cajueiro e coqueiro, pé de azeitona”, conta Meire Santos. Nascida e criada numa comunidade ribeirinha na Ilha das Canárias, no coração do Delta do rio Parnaíba, entre os municípios de Araioses (MA) e Ilha Grande (PI), ela vê a tradição se perdendo pelo caminho.
“As gerações que estão vindo agora não tiveram o mesmo privilégio de viver o que a gente viveu.”
Por isso, Meire quer que a filha Maria Clara, de 1 ano e 2 meses, tenha contato com os conhecimentos tradicionais do seu povo e viva a infância em meio à natureza. Agora, o seu desejo está um passo mais próximo de se tornar realidade. Isso porque a aprovação do ECA Ambiental (PL 2225/2024) na Câmara dos Deputados quer garantir que toda criança e todo adolescente tenha acesso à natureza.
Além disso, a política nacional de direitos de crianças e adolescentes à natureza propõe formas de aproximá-los do meio ambiente e proteger suas vidas com:
- Mais espaços verdes nas cidades
- Escolas conectadas com a natureza
- Proteção em casos de eventos climáticos extremos
“A criança que tem natureza disponível ao redor para desfrutar e investigar tem condições mais saudáveis de vida”, diz Leila Vendrametto, gerente de Natureza do Instituto Alana. Morar perto de áreas verdes antes, durante e nos primeiros anos de vida também está associado a menores taxas de comprometimento intelectual, dificuldades de aprendizagem, TDAH e transtornos do espectro autista. Os achados são de um estudo realizado por cientistas de Harvard, em parceria com outras instituições dos Estados Unidos.
Aquilo que a terra ensina
Uma alternativa para verdejar as cidades é transformar e adaptar as escolas colocando a natureza no centro. Mas essa não é a realidade para quatro entre dez escolas brasileiras das capitais, que não têm áreas verdes. A situação é ainda mais grave em favelas e áreas de risco. É o que revelou uma pesquisa realizada em 2024 pelo Instituto Alana em parceria com a Fiquem Sabendo, com informações do MapBiomas.
A comunidade da Ilha das Canárias faz parte das 11,8 milhões de pessoas que vivem em unidades de conservação no Brasil, conforme divulgou o Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Lá, as crianças recebem uma educação enriquecida pelos saberes ribeirinhos e integrada com a natureza. De acordo com Meire, os professores investem em atividades de campo nas duas escolas e fogem um pouco do currículo convencional para garantir que a cultura local faça parte dos planos de aula. “A gente não quer que essa cultura morra e então tentamos repassar os costumes”, diz.
Para Leila Vendrametto, “diferente das escolas de grandes centros, escolas que ficam próximas de Unidades de Conservação acabam sendo espaços para se praticar a educação ambiental”. Assim, quanto mais conectadas com a natureza, mais as crianças vão fazer leituras de cenário e conhecer sobre os ciclos. Ou seja, podem perceber se choveu muito ou pouco, reparar em um bicho novo que surgiu ou outro que desapareceu, por exemplo.
Foi depois de deixar Fernando de Noronha (PE) para estudar biologia, em Natal (RN), que Lisandra Bezerra percebeu, aos 17 anos, que a sua infância tão perto da natureza a colocava em vantagem em relação aos colegas. “Eu notava que alguns estavam vivenciando pela primeira vez coisas que eu tinha contato desde criança. Isto é, que a gente aprende na prática desde a creche.”
Segundo ela, a educação ambiental esteve sempre ligada às demais disciplinas nas duas escolas da ilha (uma de ensino infantil e uma de ensino fundamental). E esses conhecimentos vinham sempre permeados pelas experiências de cada criança.
LEIA NA INTEGRA EM LUNETAS