Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

Adoção: perfil da adoção no Brasil e os desafios na garantia dos direitos de crianças e adolescentes

quarta-feira, 06 de novembro de 2019, 11h58

 

No mês das crianças, site do MP traz série de reportagens sobre adoção

No mês das crianças, site do MPGO traz série de reportagens sobre adoção


Atualmente no Brasil, de acordo com dados do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA), existem 46.082 pretendentes a adoção no País. Em Goiás, são 1.492. No outro lado, o cadastro registra 9.594 crianças e adolescentes colocados sob guarda para fins de adoção; 207 em Goiás.


O SNA é um sistema de informações, hospedado nos servidores do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que consolida os dados de todas as Varas da Infância e da Juventude do País referentes a crianças e adolescentes em condições de serem adotados e de pretendentes habilitados à adoção.


As informações constantes no sistema revelam que os critérios apontados nacionalmente pelos pretendentes são preferência à criança branca (92,07% dos pretendentes), de até cinco anos (72,96%), sem doenças (60,29%) e que não tenha irmãos (61,44%) – confira aqui a íntegra do relatório estatístico coletado no mês de outubro. Por outro lado, as crianças aptas a serem adotadas são, em sua maioria, pardas (78,05%), têm mais de 5 anos (71,37%) e possuem irmãos (54,98%) – veja relação completa .


Em Goiás, dados da Divisão Interprofissional do Juizado da Infância e Juventude de Goiânia de maio deste ano apontam que este perfil se repete. Os pretendentes buscam adotar crianças brancas (91,53%), sem irmãos (59,35%) e de até 5 anos (76,07%).


Contudo, esta relação não é uma conta que precisa ter um resultado exato. Conforme observa a subprocuradora-geral de Justiça para Assuntos Institucionais do Ministério Público de Goiás (MP-GO), Laura Maria Ferreira Bueno, a adoção é uma escolha de amor. “Há pessoas que buscam um perfil de criança recém-nascida, porque este é o desejo para a família e outras que optam por adotar independentemente da idade. São escolhas muito pessoais”, afirmou.

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“Não existe um certo ou errado na escolha do perfil”, pondera Vera Lúcia Cardoso, da ONG Conviver

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A presidente do conselho deliberativo da organização não governamental Grupo de Estudos e Apoio à Adoção e à Convivência Familiar (Conviver), Vera Lúcia Cardoso, acrescenta que a decisão pela adoção é baseada no afeto. “Não existe um certo ou errado na escolha do perfil”, ponderou. A entidade, que atua em Goiânia desde 2015, busca ser um apoio a pretendentes que ainda estão aguardando o processo de adoção e para aqueles que já concluíram e vivenciam as novas experiências da paternidade ou maternidade.


Compartilhar experiências

O caminho a ser seguido pelos pretendentes à adoção pode ser menos solitário com o apoio de organizações ou entidades de apoio e esclarecimentos aos futuros pais. Em Goiânia, e mais recentemente em Aparecida de Goiânia, a Conviver promove reuniões mensais, por meio do trabalho de voluntários que coordenam a troca de experiências entre os participantes. A entidade, que integra a Associação Nacional de Grupos de Apoio à Adoção (Angaad), acompanha atualmente cerca de 300 famílias, algumas também de municípios da Região Metropolitana de Goiânia.


Além desses encontros mensais, o grupo conta com uma equipe técnica de 10 psicólogos que estudam a construção de vínculos na adoção e acompanham famílias em estágio de convivência, em guarda provisória e no pós-adoção. Esta mesma equipe auxilia a preparação psicossocial para adoção das crianças e adolescentes que vivem em instituições de acolhimento.


Outra vertente de atuação é a realização de cursos de preparação psicossocial e jurídica para a adoção, que são realizados desde 2003. Pelo menos uma vez ao ano, o curso é oferecido em Goiânia, visando contemplar famílias de outras localidades que eventualmente não ofereçam o curso. Esta preparação é exigência legal e requisito necessário para a habilitação e inserção do nome no Sistema Nacional de Adoção (SNA).


De acordo com Orlando Júnior, assessor jurídico da entidade, o curso é parte fundamental na preparação dos pretendentes à adoção, pois é um momento que permite haver esclarecimento de aspectos legais e práticos do processo de adoção. Segundo ele, a possibilidade de realizar o curso, além de orientar as famílias, diminui a angústia deste processo de expectativas.


Busca ativa

A Conviver também promove, em auxílio ao Poder Judiciário, a busca ativa, a qual consiste na procura por famílias para adoção de crianças e adolescente que, por algum motivo, têm mais dificuldades em encontrar famílias que as adotem. Como exemplos da utilização da busca ativa estão as crianças maiores de 8 anos, os adolescentes, os grupos de irmãos e as crianças com problemas de saúde. “Desde que começamos a fazer a busca ativa, há cerca de um ano, conseguimos a colocação de mais de 30 crianças e adolescentes, consideradas de difícil colocação”, afirma Vera Lúcia.


O método da busca ativa, foi previsto pela primeira vez em 2006, no Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária – clique aqui . Ela reitera a importância do curso de preparação, ao observar que, esclarecendo as famílias sobre a realidade da adoção e seus diversos aspectos é possível evitar a devolução de crianças e adolescentes. “A busca ativa funciona se houver preparação”, asseverou.


A juíza Maria Socorro destaca a importância de se criar e intensificar programas efetivos de sensibilização junto aos pretendentes para adoção tardia. Uma solução a ser encontrada para esta realidade seria “fortalecer vínculos com associações e facilitar a busca ativa”, ponderou.


Diferentes perfis

Na reunião da Conviver deste mês de outubro o tema debatido pelos pretendentes à adoção foi “o primeiro encontro”. O momento em que o pai ou a mãe vai encontrar o filho pela primeira vez. A emoção dos relatos contagia. No grupo, estão pretendentes de ambos os sexos, de idades variadas, alguns solteiros e outros em uniões homo ou heteroafetivas.


O que claramente os une são as enormes expectativas em relação ao novo. A cada história compartilhada, os demais participantes e também os voluntários que moderam o grupo aconselham, esclarecem e animam.


A longa jornada da espera e também os dilemas e desafios são divididos em uma escuta atenta e cheia de empatia. Por outro lado, o orgulho, aprendizado e amor, colhidos da experiência da adoção, são igualmente reconhecidos e celebrados.


Experiências pessoais

A filha de Vera Lúcia hoje tem 25 anos, formou-se em jornalismo e mora em São Paulo. A experiência da adoção, para ela, “foi uma mudança total de vida, descobri o trabalho voluntário e, simplesmente, me tornei mãe”. Elita Paula, diretora administrativa da Conviver, acrescenta que a adoção feita por Vera mudou não somente a vida dela, mas de várias outras pessoas. “Hoje ela é mãe de cerca de mil famílias, que estão passando ou passaram pelo mesmo processo e recebem apoio”, afirmou.


A vivência da maternidade para Elita teve início há cinco anos e meio, com a adoção de três irmãos, de 8, 10 e 12 anos, apesar de inicialmente ter o desejo por uma criança de até 6 meses de vida. Foi no curso de formação que ela mudou a perspectiva para a possibilidade da adoção tardia. Há um ano atrás chegou a “caçula” da casa, adotada aos 15 anos. “Adotar me modificou por inteira, como filha, mulher, mãe. Eles me tiraram da minha zona de conforto”.


Orlando Júnior é pai de um garoto de 3 anos. “O que é a adoção para mim? A adoção mudou quem eu sou, mudou a minha vida! Ele me ama de forma incondicional e eu também o amo incondicionalmente. Ele e minha mulher são tudo na minha vida”.


Desafios

De acordo com a coordenadora da Área da Infância Juventude e Educação do Centro de Apoio Operacional do MP-GO, Cristiane Marques de Souza, um dos desafios a serem enfrentados na garantia dos direitos das crianças e adolescentes que vivem em instituições de acolhimento na expectativa da adoção é que, muitas vezes as questões da infância são absorvidas por todas as outras demandas trabalhadas no âmbito das Promotorias de Justiça, não sendo possível tirar do papel a prioridade absoluta que é a infância.


Ela citou ainda como fragilidade a falta de equipe técnica que possa dar suporte para que estes processos ganhem mais agilidade. “São processos que exigem o auxílio de outras áreas de conhecimento, vistorias e outras medidas que acabam por gerar prazos longos”, afirmou. Por fim, ela observa que, por vezes, falta formação específica dos operadores do sistema de Justiça que lidam com o tema.


O promotor de Justiça Ricardo Papa, titular da 38ª Promotoria de Justiça de Goiânia, que atua na área da infância e juventude, cita outros dois desafios: combater a adoção dirigida, que, segundo ele, não diminuiu, mesmo 10 anos após a vigência da Lei nº 12.010/2009. Para ele, é um desafio formalizar a situação dos pais que não querem ficar com seus filhos, esclarecer que a entrega pode ser feita judicialmente sem nenhum tipo de medo de se expor, sem qualquer constrangimento. O outro desafio apontado é o de tentar a reintegração familiar de uma maneira mais precoce, ainda na infância, sobretudo na primeira infância, visando diminuir o período de acolhimento institucional.


A juíza Maria Socorro da Silva igualmente aponta que é fundamental afastar a ideia de que a mãe que entregar o bebê no Juizado, logo após o parto, está cometendo um crime. “A entrega legal não acarreta nenhum tipo de pena e é incentivada pela legislação para se evitar a entrega clandestina, irregular ou comercialização de crianças”, afirmou.

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“A entrega legal não acarreta nenhum tipo de pena e é incentivada pela legislação para se evitar a entrega clandestina, irregular ou comercialização de crianças”, explica a juíza Maria Socorro da Silva.

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Ela acrescenta que é também desafio imprimir celeridade ao processo de adoção, em atenção a recomendação do Conselho Nacional de Justiça e a Lei nº. 13.509/2017, buscando concluir o procedimento judicial no prazo de 120 dias (art. 47, §10º do Estatuto da Criança e do Adolescente).


Lista de adoção

A defensora pública Bruna Xavier aponta que um dos desafios é conseguir acompanhar o andamento da lista de adoção. Segundo ponderou, há uma ausência de conhecimento sobre o real posicionamento dos pretendestes. Já para o encarregado de Escrivania do 1º Juizado da Infância e Juventude da Comarca de Goiânia, Vinicius Balestra Baião, há também se ter atenção por parte dos Tribunais de Justiça na estruturação das Varas de Infância e Juventude, tanto quanto ao material humano (equipes técnicas e escrivanias) quanto de informática (processo digital), a fim de imprimir a celeridade necessária que o procedimento de adoção exige.


O servidor observa que um dos grandes desafios no processo de adoção, é quando há necessidade de expedição de carta precatória para outros estados, haja vista que cada Tribunal possui uma realidade de funcionamento, expediente, demanda de serviço, disponibilidade de servidores e informatização de processos, o que torna imprevisível o retorno da deprecata (documentação). “Para mitigar o problema, seria interessante a criação de Varas Especializadas em Adoção e unificação de sistemas de processos judiciais, assim como o aumento de servidores para atender a demanda de cada setor”, pondera. (Texto: Cristina Rosa - Arte: Daniel Borges - estagiário/Assessoria de Comunicação Social do MP-GO)


Serviço

Grupo Apoio à Adoção e a Convivência Familiar de Goiânia – Conviver
Local: Rua 84 nº 209, Setor Sul, Goiânia (Igreja Adventista)
Reuniões mensais: primeira terça-feira de cada mês (19 horas)
E-mail: adocaoconviver@gmail.com
Telefone de contato: (62) 98117-1461

Grupo Apoio à Adoção e a Convivência Familiar de Aparecida de Goiânia – Conviver
Local: Rua Iguaçu, 517-545, Vila Brasília (Faculdade Sul D’América)
Reuniões mensais: segunda quarta-feira do mês (19 horas)
E-mail: elita_paula@hotmail.com
Telefone: (62) 98623-4695

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FONTE: www.mpgo.mp.br


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