Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

TJMT/Ação conjunta: órgãos públicos agem rápido e regularizam benefício assistencial à criança em Barão

sábado, 14 de março de 2020, 09h05

13.03.2020 10:37

Quando os primeiros raios de sol iluminaram o pequeno cômodo que divide com o marido e o neto Leandro na casa da irmã, na manhã de 29 de fevereiro, a dona de casa Alessandra Nunes do Nascimento, 39, pulou da cama disposta a resolver um problema que a atormentava há anos: a falta de dinheiro para dar mais conforto à criança, que possui graves deficiências. A esperança de dona Alessandra era conseguir atendimento no projeto Ribeirinho Cidadão, que naquele sábado aportava em Barão de Melgaço.

 

Uma ambulância do município levou dona Alessandra e Leandro, que necessita de cadeira de rodas para se locomover, até o local de atendimento. Ali, em uma ação conjunta do Poder Judiciário de Mato Grosso, Defensoria Pública, Ministério Público e INSS, ela conseguiu transferir para o nome dela o benefício social de Leandro, que até então era pago à mãe biológica dele, filha de Alessandra. Como o pai biológico de Leandro é conhecido, ali no local de atendimento também já foi feito um acordo para que ele pague R$ 300,00 por mês de pensão alimentícia ao menino.

 

Era difícil para dona Alessandra explicar a felicidade que sentia naquele momento, quando tudo foi resolvido. Ela poderia enfim oferecer mais qualidade de vida ao neto, e, quem sabe, mudar para uma casa só deles. O terreno ela já tem e a casa começou a ser levantada, quando a mãe biológica de Leandro recebeu de uma só vez o pagamento dos primeiros meses de benefício, que totalizaram R$ 17 mil. No entanto, a mãe biológica, que é dependente química, parou de comprar material para a construção e sumiu, deixando Leandro aos cuidados da avó. Isso há cerca de três anos.

 

Mãe aos 13 anos - Dona Alessandra cria Leandro desde bebezinho, porque a mãe dele tinha apenas 13 anos quando ele nasceu e ainda morava com dona Alessandra. Por volta dos 3 anos, Leandro passou mal e foi levado ao médico, que descobriu que o menino tinha um tumor cerebral, além de diabetes, problemas na tireoide e uma doença degenerativa. Leandro foi operado do tumor e se recuperou, mas precisava tomar vários medicamentos ao dia por conta das outras doenças diagnosticadas.

 

Era o ano de 2017 e, de posse do diagnóstico de Leandro, a mãe biológica procurou o INSS para receber o benefício social conhecido popularmente como LOAS (Lei Orgânica de Assistência Social, que prevê o pagamento do Benefício de Prestação Continuada para idosos e deficientes carentes). Quando o dinheiro foi liberado, ela sacou a quantia, pegou Leandro e saiu da casa da mãe, para morar com o então namorado, com quem já tem outros filhos. Ela começou a construir uma casa que seria para o futuro de Leandro, mas o plano foi abandonado, assim como os cuidados com o menino, que ficou sem remédio, o que agravou muito a situação dele, que ficou à beira da morte. Foi então que a avó o reencontrou, já no Pronto Socorro de Várzea Grande, onde ele ficou internado durante nove meses.

 

Nesse período, a mãe biológica sumiu e dona Alessandra ficava dia e noite com o neto no hospital. Familiares, amigos e vizinhos diziam para ela que desistisse, que Leandro não se recuperaria, mas ela tinha fé, e permaneceu ao lado dele até a alta. Mas o menino nunca mais seria o mesmo. Agora já não andava, não falava e só se alimentava por sonda, que ela mantém em casa, ao lado da cama. “O que me dói e que a mãe esperou ele ficar desse jeito pra me entregar. Poderia faltar tudo pra mim, mas pra ele, nunca. Dezessete mil não valeram a saúde do meu neto”, lamenta dona Alessandra.

 

A avó não pode trabalhar, pois dedica as 24 horas do dia para cuidar do neto. “Da meia-noite pra frente ele não dorme, é muito remédio. Depois dou banho, coloco na cadeira e passeio com ele. É o dia todo assim”. Para sobreviver, dona Alessandra conta com ajuda de vizinhos e da Secretaria de Assistência Social de Barão de Melgaço, que fornece leite, remédio, e outros produtos de necessidade, como fraldas descartáveis.

 

Pipa e bola - Elétrico. Assim dona Alessandra definiu o comportamento de Leandro antes de deixar a casa dela para morar com a mãe e voltar em uma cadeira de rodas. Ele gostava de soltar pipa, jogar bola, e mesmo depois de operar o tumor na cabeça, continuava brincando e correndo na rua, deixando a avó apreensiva. “Eu ficava atrás dele toda hora e ele me dizia que estava brincando e não iria cair. Quando falaram que ele ia ficar desse jeito, numa cama, fiquei triste, mas Deus sabe o que faz e eu confio nele”.

 

Justiça Comunitária - O caso de Leandro poderia nunca chegar ao conhecimento da Justiça se não fosse a sensibilidade e a atuação firme da agente comunitária de justiça de Barão de Melgaço, Silvia Adriana Soares. Ela soube da história do menino há alguns anos, ao ser procurada pela mãe, que queria receber pensão alimentícia. Na época, Adriana, como é mais conhecida, disse que Leandro morava com a mãe biológica e a avó, dona Alessandra, e era um menino normal, falava, andava e brincava. Ela orientou a mãe biológica sobre o processo de alimentos e o tempo passou.

 

Da outra vez que soube de Leandro ele já estava internado na CTI do Pronto Socorro de Várzea Grande. Adriana então entrou em contato com a mãe biológica do menino, para saber o que havia acontecido. As histórias da mãe eram confusas, e após uma breve investigação, a agente comunitária soube que ele adoeceu porque deixou de tomar um medicamento, quando estava morando sozinho com a mãe.

 

Desde então passou a acompanhar a vida do menino e da avó. Quando soube que a mãe recebia o benefício e não ajudava em nada, procurou o juiz coordenador da Justiça Comunitária, José Antônio Bezerra Filho, buscando uma solução. Coincidentemente, a 13ª edição do projeto Ribeirinho Cidadão estava prestes a começar e estaria em Barão de Melgaço em breve. O atendimento foi agendado para o município e a espera encheu a todos de expectativa. “Não foi a primeira vez que procurei a Justiça Comunitária e tive uma resposta rápida”, disse Adriana.

 

O envolvimento da agente comunitária de Justiça com Leandro e dona Alessandra há muito tempo saiu do campo do serviço social para se transformar em um caso de amor e amizade. Adriana lembrou que, como toda criança, Leandro tem direito de brincar, de estudar, de ter uma vida. “O Leandro mostrou ser um guerreiro, me ensinou a crescer, a valorizar o ser humano”.

 

Justiça social - Em poucas horas, a ação conjunta do Poder Judiciário, da Defensoria e do Ministério Público permitiu que a mãe fosse substituída pela avó como beneficiária do dinheiro ao qual Leandro tem direito. Com a concentração do atendimento em Barão de Melgaço, a defensora pública Maria Luziane Ribeiro de Castro oficiou o INSS para alterar o beneficiário. Como dona Alessandra já tinha a guarda provisória da criança, o processo foi bem mais rápido. Presente no local, o promotor de Justiça Gustavo Dantas Ferraz emitiu parecer favorável à substituição e o juiz José Antônio Bezerra Filho assinou ali mesmo a decisão. O oficio foi levado ao posto de atendimento do INSS e a mudança foi feita na hora. O próximo pagamento já sairá em nome de dona Alessandra.

 

Durante o atendimento, defensora, promotor e juiz perceberam que Leandro tinha reconhecimento de pai na certidão de nascimento. No mesmo instante, o pai foi chamado para comparecer ao mutirão. Como não foi encontrado, o avô paterno compareceu e, diante das autoridades, assinou um acordo para pagamento de pensão alimentícia mensal no valor de R$ 300,00 ao menino. O avô é funcionário público, servidor da Prefeitura de Barão.

 

Ter contribuído para que Leandro tenha melhores condições de vida já valeu o projeto”, disse a defensora, admitindo que, sem o Ribeirinho Cidadão, dona Alessandra teria demorado bem mais para garantir os direitos da criança, pela dificuldade e custo de locomoção. “Além da resposta rápida, sem dúvida, o Ribeirinho Cidadão é fantástico pela possibilidade que a pessoa tem de resolver o problema onde ela vive, ao invés de ter que se deslocar a vários órgãos”, pontuou.

 

 

Emocionado com a situação de Leandro, o juiz José Antônio Bezerra Filho não mediu esforços para que dona Alessandra conquistasse o direito de receber o benefício do menino, para que ele tenha mais qualidade de vida. “Esse é o espírito do Ribeirinho Cidadão, é trazer justiça para essas pessoas que não têm condições de se deslocar de suas comunidades em busca de atendimento”, ressaltou o magistrado.

 

FONTE: www.tjmt.jus.br


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