Jurisprudência TJAM - Guarda. Alimentos. Necessidade de estudo psicossocial para fixação da guarda
segunda-feira, 23 de novembro de 2020, 13h53
RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DE GUARDA C/C ALIMENTOS. NECESSIDADE DE ESTUDO PSICOSSOCIAL PARA FIXAÇÃO DE GUARDA. SENTENÇA CITRA PETITA. ANULADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. - A teor dos precedentes emanados do Colendo STJ, é admissível que decisões judiciais adotem os fundamentos de manifestações constantes de peças do processo, desde que haja a transcrição de trechos das peças às quais há indicação (fundamentação aliunde ou per relationem). Precedentes (REsp 1399997/AM) - Em razão da imprescindibilidade de estudo psicossocial para fixação da guarda, restou configurado o julgamento citra petita da ação de origem, sendo necessária a declaração integral de nulidade da decisão - Recurso conhecido e provido.(TJAM - AC: 06330002920158040001 AM 0633000-29.2015.8.04.0001, Relator: Anselmo Chíxaro, Data de Julgamento: 09/07/2020, Primeira Câmara Cível, Data de Publicação: 09/07/2020).
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas
Gabinete do Desembargador Ernesto Anselmo Queiroz Chíxaro
Primeira Câmara Cível
Autos n.º 0633000-29.2015.8.04.0001.
Classe: Apelação Cível.
Relator: Desembargador Ernesto Anselmo Queiroz Chíxaro.
Apelante:
Apelado:
EMENTA: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DE GUARDA C/C ALIMENTOS. NECESSIDADE DE ESTUDO PSICOSSOCIAL PARA FIXAÇÃO DE GUARDA. SENTENÇA CITRA PETITA. ANULADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
- A teor dos precedentes emanados do Colendo STJ, é admissível que decisões judiciais adotem os fundamentos de manifestações constantes de peças do processo, desde que haja a transcrição de trechos das peças às quais há indicação (fundamentação aliunde ou per relationem). Precedentes (REsp 1399997/AM).
- Em razão da imprescindibilidade de estudo psicossocial para fixação da guarda, restou configurado o julgamento citra petita da ação de origem, sendo necessária a declaração integral de nulidade da decisão.
- Recurso conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.º 0633000-29.2015.8.04.0001, ACORDAM os Excelentíssimos Senhores Desembargadores que integram a Primeira Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, à unanimidade de votos, em conhecer do presente recurso e, no mérito, dar provimento, nos termos do voto do relator, que acompanha o presente julgado, dele fazendo parte integrante.
Sala das Sessões, em _____ de __________ de 2020, em Manaus/AM.
Presidente
Relator
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas
Gabinete do Desembargador Ernesto Anselmo Queiroz Chíxaro
Primeira Câmara Cível
Autos n.º 0633000-29.2015.8.04.0001.
Classe: Apelação Cível.
Relator: Desembargador Ernesto Anselmo Queiroz Chíxaro.
Apelante: Suelen da Silva Garcia
Apelado: Carlos Marcio Gomes Fernandes.
1. Relatório.
Trata-se de recurso voluntário interposto por Suelen da Silva Garcia contra sentença proferida pelo MM. Juízo da 3.ª Vara de Família, que julgou parcialmente procedente os autos da ação de alimentos proposta pelo menor Marcos Vinicius Garcia Fernandes, representado por seu genitor Carlos Márcio Gomes Fernandes.
Em sentença (fls. 64-65), o juízo de origem julgou parcialmente procedente o pedido inicial, condenando a ora Apelante ao pagamento de pensão alimentícia em favor do Apelado o valor equivalente a 20% (vinte por cento) do salário mínimo; condenou, ainda, ao pagamento de custas e honorários advocatícios arbitrados em um salário mínimo nacional vigente.
A parte apelante apresentou suas razões (fls. 70/75) alegando, em síntese, que o recurso deve ser provido, a fim de que a sentença seja reformada, para que seja julgada totalmente improcedente o pedido de prestação alimentícia, tendo em vista que a Apelante compartilha a guarda do menor e, portanto, as despesas devem ser igualitárias entre os genitores. Pugnou, ainda, pela concessão do benefício da justiça gratuita por não possui condições financeiras suficientes para arcar com as despesas processuais.
Não houve apresentação de contrarrazão.
O Graduado Órgão Ministerial, em preliminar de mérito, em razão de ser matéria capaz de ser arguida de ofício, manifestou-se pela decretação de nulidade da sentença por ser citra petita.
É o relato do essencial.
2. Voto.
Conheço do recurso voluntário ante a presença dos requisitos de lei para tanto.
A controvérsia recursal giro em torno da possibilidade de atribuição de guarda compartilhada entre os genitores e a necessidade de pagamento de pensão alimentícia.
Em razão de meu entendimento estar alinhado com os fundamentos escandidos no Parecer Ministerial (fls. 82-97), visando evitar a desnecessária repetição de fundamentos e ainda imprimir celeridade no julgamento do feito, com arrimo da jurisprudência emanada do Colendo STJ, transcrevo seus fundamentos, in verbis:
"No mérito, verifica-se que deve ser decretada a nulidade da sentença, pois na petição inicial de fls. 01/02 o autor pleiteia: 'Diante de todo o
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exposto, pede e espera que Vossa Excelência defira a guarda do menor em favor do Autor, condenando-se a Ré ao pagamento de pensão de alimentos equivalente a 20% (vinte por cento), sobre o valor do salário mínimo vigente, que equivale ao valor de R$157,60 (cento e cinquenta e sete reais e sessenta centavos) em favor de seu filho." . Do mesmo modo em sua contestação a requerida às fls. 19/21, se manifesta no item: "2) Requer que seja fixada a guarda compartilhada". Entretanto, embora as partes tenham se manifestado a respeito da fixação da guarda, vê-se que na sentença prolatada de fls. 64/65 a MMa. Juíza julgou apenas um dos pedidos formulados pelo autor, conforme versa em seu dispositivo: "Isto posto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTEo pedido, e condeno o requerido SUELENDA SILVA GARCIA a pagar pensão alimentícia em favor do Requerente MARCOS VINÍCIUS GARCIA FERNANDES,no valor equivalente a 20% (vinte por cento) do salário mínimo, com as observações já constantes da decisão interlocutória já proferida nos autos." . Portanto, verifica-se que nada foi mencionado a respeito da definição de guarda do menor, pois os pedidos formulados na inicial não foram examinados em toda sua amplitude, o que viola o princípio da Congruência ou Adstrição, tendo em vista que o magistrado deve decidir a lide baseado nos limites objetivados pelas partes, não podendo proferir sentença de forma citra petita visto que constitui vício e, desse modo, acarreta a nulidade do ato decisório.
Ressalte-se, que desde a primeira audiência de conciliação ocorrida no dia 06/07/2016 às fls. 18 dos autos, consta que "as partes informaram que a criança permanece em regime de guarda compartilhada, residindo pelo período de uma semana na casa do pai, ora requerente, e uma semana na casa da mãe, ora requerida que as despesas com a criança são custeadas pelos genitores quando permanecem em seu convívio" . Todavia nota-se que o autor (pai) pede a guarda unilateral da criança e a fixação de alimentos em seu favor, alegando que a criança não é bem cuidada pela requerida (mãe), no período que fica com ela, enquanto que a genitora, ora apelada, pede para que continue no atual sistema de guarda compartilhada. Como não houve a possibilidade de conciliação dada a divergência de interesses, foi determinado o encaminhamentos das partes à Equipe Multidisciplinar para que fosse feito o estudo psicossocial, pela conciliadora.
Pois bem, dado prosseguimento ao feito foi realizada a audiência de instrução e julgamento às fls. 61/62, na qual a requerida (genitora) não esteve presente, mesmo estando devidamente intimada, conforme atesta a certidão de fls. 51/53. Na ocasião, foi dada a palavra ao autor (genitor) o qual aduziu: "Que trabalha como auxiliar de serviços gerias e ganha R$ 1.020,00; Que mora juntamente com a sua mãe, o requerente e um sobrinho; Que a requerida trabalha no Atack; Que ela começou agora a trabalhar lá, é um contrato de experiencia; que a requerida possuium filho de 11 anos; que o depoente possui apenas o requerente como filho; que o aluguel da casa em que mora é dividido com o depoente e sua mãe; que possui gastos com transporte coletivo porque não possui carro; que o
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requerente vai para a escola a pé; que a requerida não paga pensão; que a requerida mora com mãe e outros irmãos; que antes do atack a requerida trabalhava numa panificadora; que gostaria de receber de R$ 200,00 a R$ 300,0 de pensão; que o filho de 11 anos da requerida é cuidado pela mãe dela" . Em seguida, foi dada a palavra ao seu Defensor Público, que em resposta as perguntas formuladas por este, o autor, ora apelado, respondeu: "que o pai biológico desse filho de 11 anos não paga pensão; que a requerida nunca contribuiu com o sustento do requerente; que apesar da guarda compartilhada o menor não quer ficar com a requerida".
Infelizmente o Ministério Público que se fez presente na mesma audiência, nada suscitou a respeito da ausência do resultado do estudo psicossocial para a definição do regime de guarda, embora se verifique que no caso em tela é de suma importância a realização desse estudo, pois o Parecer Ministerial que consta às fls. 63, opina favorável apenas para o valor a ser pago pela requerida (mãe), ora apelante no percentual de 20% (vinte por cento) do salário mínimo a titulo de pensão alimentícia em favor do menor.
Ademais, a sentença de fls. 64/65 acolheu parcialmente o pedido do autor, no que se refere unicamente aos alimentos, constata-se que, a sentença encontra-se equivocada ao determinar de pronto a fixação de alimentos sem que seja estabelecido o regime da guarda do menor em questão, e que ao meu ver só seria possível com o estudo psicossocial, diante da animosidade existente entre seus pais, inclusive pelas afirmações do requerente contidas na referida audiência de instrução e julgamento.
Apesar das referidas afirmações, não houve produção de provas que viesse a confirmar o que foi dito pelo autor na audiência de instrução e julgamento, pois a modificação da guarda só pode ser autorizada se verificado fatos graves, em nome da segurança das relações jurídicas e do equilíbrio emocional do menor, devendo ser sempre considerado os desejos e sentimentos da criança, para fins de decisão acerca de sua situação, com vistas a minimizar os efeitos negativos de qualquer alteração que se verifique em sua realidade. Haja vista, que a troca da guarda do infante exige prova forte e suficiente dos alegados, maus tratos e negligência por parte da mãe. Pois somente se existirem razões muito sérias ou considerações morais relevantes, devidamente comprovadas, autorizam o julgador modificar a guarda do menor, tendo em vista que o seu bem estar social, psicológico e emocional são fatores que o juiz há de considerar na decisão de alterar a guarda, devendo sempre prevalecer o interesse da criança sobre qualquer outro.
O juiz é o destinatário das provas, cabendo a ele aferir e aquilatar sobre a necessidade ou não de sua produção, a teor do que estabelece os arts. 370 e 371 do Código de Processo Civil de 2015.
Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as
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diligências inúteis ou meramente protelatórias.
Desta maneira, resta evidente que o caso em análise se adequa à hipótese constante no art. 1.013, § 3º, inciso III do Código de Processo Civil, face a douta Magistrada não ter analisado todos os pedidos constantes na inicial, como já dito.
Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.
Nesse sentido, a Jurisprudência:
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"COMPRA E VENDA DE GASES - OXIGÊNIO E DIÓXIDO DE CARBONO LÍQUIDOS - VÍCIO DE JULGAMENTO CITRA PETITA - RECONHECIMENTODE OFÍCIO - SENTENÇA ANULADA". "A lide é limitada pelo pedido, o que significa dizer que o juiz não pode julgar fora (sentença extra petita), nem ficar aquém (sentença citra petita) ou além (sentença ultra petita) do que foi pedido. É o princípio da adstrição do juiz ao pedido da parte (art. 492 do CPC)". (TJSP; Apelação Cível 1000011-62.2017.8.26.0601; Relator (a): Renato Sartorelli; Órgão Julgador: 26ª Câmara de Direito Privado; Foro de Jundiaí - 4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 27/06/2019; Data de Registro: 28/06/2019).
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NULIDADE DA SENTENÇA RECONHECIDA DE OFÍCIO – INAPLICABILIDADE DO ART. 1.013, § 3º, DO CPC– SENTENÇAANULADA – RETORNO DOS AUTOS À COMARCA PARA NOVO JULGAMENTO. Ao magistrado cabe compor a lide nos limites do pedido do autor e da resposta do réu, sendo-lhe defeso ir aquém (infra ou citra petita), além (ultra petita), ou fora (extra petita) das questões suscitadas pelas partes, nos termos do artigo 492 do Código de Processo Civil. Tendo a parte autora, na inicial, formulado pedido de consignação em pagamento e efetuado depósito das parcelas em conta única, não sendo analisado nos autos referido pleito e nem o pedido de emenda da inicial, o julgamento é citra petita, sendo nula, portanto, a sentença recorrida, cuja preliminar pode ser arguida de ofício. (TJMS. Apelação Cível n. 0800581-74.2016.8.12.0013, Jardim, 3ª Câmara Cível, Relator (a): Des. Amaury da Silva Kuklinski, j: 11/07/2019, p: 12/07/2019).
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. PREVI. APRECIAÇÃO DE PEDIDO DISTINTO DAQUELE FORMULADO NA PETIÇÃO INICIAL. SUPERÁVITS SUCESSIVOS. RESERVA ESPECIAL. NULIDADE DE REPASSES AO PATROCINADOR. PROPORCIONALIDADE CONTRIBUTIVA. QUESTÕES QUE NÃO INTEGRAM O OBJETO DO LITÍGIO. PEDIDO NÃO FORMULADO NA INICIAL. SENTENÇA CITRA E EXTRA PETITA. NULIDADE. RECONHECIMENTO EX OFFICIO. JULGAMENTO IMEDIATO PELO TRIBUNAL. ART. 1.013, § 3º, DO CPC. IMPOSSIBILIDADE. PRODUÇÃO DE PROVA. NECESSIDADE.CASSAÇÃO. 1. Segundo o princípio da congruência, adstrição, simetria ou paralelismo, presente nos art. 2º, 128, 293 e 460, todos do CPC, a sentença deve resolver a lide nos exatos limites da demanda, não podendo se posicionar além do que foi pedido (ultra petita), nem aquém (citra ou infra petita), tampouco dele se alhear (extra petita), sob pena de nulidade do ato decisório, ressalvadas as matérias cognoscíveis de ofício. 2. Considerando a falta de apreciação dos pedidos que foram declinados na petição inicial, somado ao fato de que na sentença foram contemplados pedidos outros não mencionados pelo autor em sua petição inicial, configurando julgamento citra e extra petita, sua nulidade é medida que se impõe. Possível o reconhecimento ex officio do vício no julgamento. 3. A sentença extra e citra petita não pode ser reformada, devendo ser anulada, para que a questão seja novamente apreciada pelo Juízo natural, pois, a não observância ao princípio da congruência, implica o cerceamento da defesa. 4. Preliminar suscitada de ofício acolhida. Sentença desconstituída. Apelação prejudicada. (Acórdão 1205648, 07382540220188070001,
Relator: ALFEU MACHADO, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 25/9/2019, publicado no DJE: 9/10/2019. Pág.: Sem Página Cadastrada.).
Diante do exposto, por ser matéria de ordem pública, este Graduado
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Órgão Ministerial opina pela decretação da nulidade da sentença, por ser citra petita, restando assim, prejudicado o mérito recursal.
É o parecer.
Manaus, 27 de Fevereiro de 2020.
SANDRA CAL OLIVEIRA
Procuradora de Justiça"
Pois bem, em razão da imprescindibilidade de estudo psicossocial para fixação da guarda, restou configurado o julgamento citra petita da ação de origem, sendo necessária a declaração integral de nulidade da decisão.
Nesse sentido, trago o entendimento do STJ sobre o tema:
AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. JULGAMENTO CITRA PETITA. 1. Encontra-se em harmonia com a jurisprudência desta Corte o acórdão que determina a cassação da sentença proferida com julgamento citra petita. Incidência do óbice da Súmula 83/STJ. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 798.893 - RJ (2015/0264437-0) Relatora Ministra Maria Isabel Gallotti Data do Julgamento:16 de fevereiro de 2017)
3. Dispositivo.
Diante do exposto, conheço do presente recurso voluntário e, no mérito, dou provimento a fim de anular a sentença, determinando o retorno dos autos à origem para os devidos fins.
É como voto
Manaus/AM, _____ de __________ de 2020.
Desembargador Ernesto Anselmo Queiroz Chíxaro
RelatorPoder Judiciário
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Gabinete do Desembargador Ernesto Anselmo Queiroz Chíxaro
Primeira Câmara Cível
Autos n.º 0633000-29.2015.8.04.0001.
Classe: Apelação Cível.
Relator: Desembargador Ernesto Anselmo Queiroz Chíxaro.
Apelante: Suelen da Silva Garcia
Apelado: Carlos Marcio Gomes Fernandes.
EMENTA: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DE GUARDA C/C ALIMENTOS. NECESSIDADE DE ESTUDO PSICOSSOCIAL PARA FIXAÇÃO DE GUARDA. SENTENÇA CITRA PETITA. ANULADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
- A teor dos precedentes emanados do Colendo STJ, é admissível que decisões judiciais adotem os fundamentos de manifestações constantes de peças do processo, desde que haja a transcrição de trechos das peças às quais há indicação (fundamentação aliunde ou per relationem). Precedentes (REsp 1399997/AM).
- Em razão da imprescindibilidade de estudo psicossocial para fixação da guarda, restou configurado o julgamento citra petita da ação de origem, sendo necessária a declaração integral de nulidade da decisão.
- Recurso conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.º 0633000-29.2015.8.04.0001, ACORDAM os Excelentíssimos Senhores Desembargadores que integram a Primeira Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, à unanimidade de votos, em conhecer do presente recurso e, no mérito, dar provimento, nos termos do voto do relator, que acompanha o presente julgado, dele fazendo parte integrante.
Sala das Sessões, em _____ de __________ de 2020, em Manaus/AM.
Presidente
Relator
Poder Judiciário
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Primeira Câmara Cível
Autos n.º 0633000-29.2015.8.04.0001.
Classe: Apelação Cível.
Relator: Desembargador Ernesto Anselmo Queiroz Chíxaro.
Apelante: Suelen da Silva Garcia
Apelado: Carlos Marcio Gomes Fernandes.
1. Relatório.
Trata-se de recurso voluntário interposto por Suelen da Silva Garcia contra sentença proferida pelo MM. Juízo da 3.ª Vara de Família, que julgou parcialmente procedente os autos da ação de alimentos proposta pelo menor Marcos Vinicius Garcia Fernandes, representado por seu genitor Carlos Márcio Gomes Fernandes.
Em sentença (fls. 64-65), o juízo de origem julgou parcialmente procedente o pedido inicial, condenando a ora Apelante ao pagamento de pensão alimentícia em favor do Apelado o valor equivalente a 20% (vinte por cento) do salário mínimo; condenou, ainda, ao pagamento de custas e honorários advocatícios arbitrados em um salário mínimo nacional vigente.
A parte apelante apresentou suas razões (fls. 70/75) alegando, em síntese, que o recurso deve ser provido, a fim de que a sentença seja reformada, para que seja julgada totalmente improcedente o pedido de prestação alimentícia, tendo em vista que a Apelante compartilha a guarda do menor e, portanto, as despesas devem ser igualitárias entre os genitores. Pugnou, ainda, pela concessão do benefício da justiça gratuita por não possui condições financeiras suficientes para arcar com as despesas processuais.
Não houve apresentação de contrarrazão.
O Graduado Órgão Ministerial, em preliminar de mérito, em razão de ser matéria capaz de ser arguida de ofício, manifestou-se pela decretação de nulidade da sentença por ser citra petita.
É o relato do essencial.
2. Voto.
Conheço do recurso voluntário ante a presença dos requisitos de lei para tanto.
A controvérsia recursal giro em torno da possibilidade de atribuição de guarda compartilhada entre os genitores e a necessidade de pagamento de pensão alimentícia.
Em razão de meu entendimento estar alinhado com os fundamentos escandidos no Parecer Ministerial (fls. 82-97), visando evitar a desnecessária repetição de fundamentos e ainda imprimir celeridade no julgamento do feito, com arrimo da jurisprudência emanada do Colendo STJ, transcrevo seus fundamentos, in verbis:
"No mérito, verifica-se que deve ser decretada a nulidade da sentença, pois na petição inicial de fls. 01/02 o autor pleiteia: 'Diante de todo o
Poder Judiciário
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Gabinete do Desembargador Ernesto Anselmo Queiroz Chíxaro
exposto, pede e espera que Vossa Excelência defira a guarda do menor em favor do Autor, condenando-se a Ré ao pagamento de pensão de alimentos equivalente a 20% (vinte por cento), sobre o valor do salário mínimo vigente, que equivale ao valor de R$157,60 (cento e cinquenta e sete reais e sessenta centavos) em favor de seu filho." . Do mesmo modo em sua contestação a requerida às fls. 19/21, se manifesta no item: "2) Requer que seja fixada a guarda compartilhada". Entretanto, embora as partes tenham se manifestado a respeito da fixação da guarda, vê-se que na sentença prolatada de fls. 64/65 a MMa. Juíza julgou apenas um dos pedidos formulados pelo autor, conforme versa em seu dispositivo: "Isto posto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTEo pedido, e condeno o requerido SUELENDA SILVA GARCIA a pagar pensão alimentícia em favor do Requerente MARCOS VINÍCIUS GARCIA FERNANDES,no valor equivalente a 20% (vinte por cento) do salário mínimo, com as observações já constantes da decisão interlocutória já proferida nos autos." . Portanto, verifica-se que nada foi mencionado a respeito da definição de guarda do menor, pois os pedidos formulados na inicial não foram examinados em toda sua amplitude, o que viola o princípio da Congruência ou Adstrição, tendo em vista que o magistrado deve decidir a lide baseado nos limites objetivados pelas partes, não podendo proferir sentença de forma citra petita visto que constitui vício e, desse modo, acarreta a nulidade do ato decisório.
Ressalte-se, que desde a primeira audiência de conciliação ocorrida no dia 06/07/2016 às fls. 18 dos autos, consta que "as partes informaram que a criança permanece em regime de guarda compartilhada, residindo pelo período de uma semana na casa do pai, ora requerente, e uma semana na casa da mãe, ora requerida que as despesas com a criança são custeadas pelos genitores quando permanecem em seu convívio" . Todavia nota-se que o autor (pai) pede a guarda unilateral da criança e a fixação de alimentos em seu favor, alegando que a criança não é bem cuidada pela requerida (mãe), no período que fica com ela, enquanto que a genitora, ora apelada, pede para que continue no atual sistema de guarda compartilhada. Como não houve a possibilidade de conciliação dada a divergência de interesses, foi determinado o encaminhamentos das partes à Equipe Multidisciplinar para que fosse feito o estudo psicossocial, pela conciliadora.
Pois bem, dado prosseguimento ao feito foi realizada a audiência de instrução e julgamento às fls. 61/62, na qual a requerida (genitora) não esteve presente, mesmo estando devidamente intimada, conforme atesta a certidão de fls. 51/53. Na ocasião, foi dada a palavra ao autor (genitor) o qual aduziu: "Que trabalha como auxiliar de serviços gerias e ganha R$ 1.020,00; Que mora juntamente com a sua mãe, o requerente e um sobrinho; Que a requerida trabalha no Atack; Que ela começou agora a trabalhar lá, é um contrato de experiencia; que a requerida possuium filho de 11 anos; que o depoente possui apenas o requerente como filho; que o aluguel da casa em que mora é dividido com o depoente e sua mãe; que possui gastos com transporte coletivo porque não possui carro; que o
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Gabinete do Desembargador Ernesto Anselmo Queiroz Chíxaro
requerente vai para a escola a pé; que a requerida não paga pensão; que a requerida mora com mãe e outros irmãos; que antes do atack a requerida trabalhava numa panificadora; que gostaria de receber de R$ 200,00 a R$ 300,0 de pensão; que o filho de 11 anos da requerida é cuidado pela mãe dela" . Em seguida, foi dada a palavra ao seu Defensor Público, que em resposta as perguntas formuladas por este, o autor, ora apelado, respondeu: "que o pai biológico desse filho de 11 anos não paga pensão; que a requerida nunca contribuiu com o sustento do requerente; que apesar da guarda compartilhada o menor não quer ficar com a requerida".
Infelizmente o Ministério Público que se fez presente na mesma audiência, nada suscitou a respeito da ausência do resultado do estudo psicossocial para a definição do regime de guarda, embora se verifique que no caso em tela é de suma importância a realização desse estudo, pois o Parecer Ministerial que consta às fls. 63, opina favorável apenas para o valor a ser pago pela requerida (mãe), ora apelante no percentual de 20% (vinte por cento) do salário mínimo a titulo de pensão alimentícia em favor do menor.
Ademais, a sentença de fls. 64/65 acolheu parcialmente o pedido do autor, no que se refere unicamente aos alimentos, constata-se que, a sentença encontra-se equivocada ao determinar de pronto a fixação de alimentos sem que seja estabelecido o regime da guarda do menor em questão, e que ao meu ver só seria possível com o estudo psicossocial, diante da animosidade existente entre seus pais, inclusive pelas afirmações do requerente contidas na referida audiência de instrução e julgamento.
Apesar das referidas afirmações, não houve produção de provas que viesse a confirmar o que foi dito pelo autor na audiência de instrução e julgamento, pois a modificação da guarda só pode ser autorizada se verificado fatos graves, em nome da segurança das relações jurídicas e do equilíbrio emocional do menor, devendo ser sempre considerado os desejos e sentimentos da criança, para fins de decisão acerca de sua situação, com vistas a minimizar os efeitos negativos de qualquer alteração que se verifique em sua realidade. Haja vista, que a troca da guarda do infante exige prova forte e suficiente dos alegados, maus tratos e negligência por parte da mãe. Pois somente se existirem razões muito sérias ou considerações morais relevantes, devidamente comprovadas, autorizam o julgador modificar a guarda do menor, tendo em vista que o seu bem estar social, psicológico e emocional são fatores que o juiz há de considerar na decisão de alterar a guarda, devendo sempre prevalecer o interesse da criança sobre qualquer outro.
O juiz é o destinatário das provas, cabendo a ele aferir e aquilatar sobre a necessidade ou não de sua produção, a teor do que estabelece os arts. 370 e 371 do Código de Processo Civil de 2015.
Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as
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diligências inúteis ou meramente protelatórias.
Desta maneira, resta evidente que o caso em análise se adequa à hipótese constante no art. 1.013, § 3º, inciso III do Código de Processo Civil, face a douta Magistrada não ter analisado todos os pedidos constantes na inicial, como já dito.
Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.
Nesse sentido, a Jurisprudência:
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"COMPRA E VENDA DE GASES - OXIGÊNIO E DIÓXIDO DE CARBONO LÍQUIDOS - VÍCIO DE JULGAMENTO CITRA PETITA - RECONHECIMENTODE OFÍCIO - SENTENÇA ANULADA". "A lide é limitada pelo pedido, o que significa dizer que o juiz não pode julgar fora (sentença extra petita), nem ficar aquém (sentença citra petita) ou além (sentença ultra petita) do que foi pedido. É o princípio da adstrição do juiz ao pedido da parte (art. 492 do CPC)". (TJSP; Apelação Cível 1000011-62.2017.8.26.0601; Relator (a): Renato Sartorelli; Órgão Julgador: 26ª Câmara de Direito Privado; Foro de Jundiaí - 4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 27/06/2019; Data de Registro: 28/06/2019).
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Gabinete do Desembargador Ernesto Anselmo Queiroz Chíxaro
NULIDADE DA SENTENÇA RECONHECIDA DE OFÍCIO – INAPLICABILIDADE DO ART. 1.013, § 3º, DO CPC– SENTENÇAANULADA – RETORNO DOS AUTOS À COMARCA PARA NOVO JULGAMENTO. Ao magistrado cabe compor a lide nos limites do pedido do autor e da resposta do réu, sendo-lhe defeso ir aquém (infra ou citra petita), além (ultra petita), ou fora (extra petita) das questões suscitadas pelas partes, nos termos do artigo 492 do Código de Processo Civil. Tendo a parte autora, na inicial, formulado pedido de consignação em pagamento e efetuado depósito das parcelas em conta única, não sendo analisado nos autos referido pleito e nem o pedido de emenda da inicial, o julgamento é citra petita, sendo nula, portanto, a sentença recorrida, cuja preliminar pode ser arguida de ofício. (TJMS. Apelação Cível n. 0800581-74.2016.8.12.0013, Jardim, 3ª Câmara Cível, Relator (a): Des. Amaury da Silva Kuklinski, j: 11/07/2019, p: 12/07/2019).
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. PREVI. APRECIAÇÃO DE PEDIDO DISTINTO DAQUELE FORMULADO NA PETIÇÃO INICIAL. SUPERÁVITS SUCESSIVOS. RESERVA ESPECIAL. NULIDADE DE REPASSES AO PATROCINADOR. PROPORCIONALIDADE CONTRIBUTIVA. QUESTÕES QUE NÃO INTEGRAM O OBJETO DO LITÍGIO. PEDIDO NÃO FORMULADO NA INICIAL. SENTENÇA CITRA E EXTRA PETITA. NULIDADE. RECONHECIMENTO EX OFFICIO. JULGAMENTO IMEDIATO PELO TRIBUNAL. ART. 1.013, § 3º, DO CPC. IMPOSSIBILIDADE. PRODUÇÃO DE PROVA. NECESSIDADE.CASSAÇÃO. 1. Segundo o princípio da congruência, adstrição, simetria ou paralelismo, presente nos art. 2º, 128, 293 e 460, todos do CPC, a sentença deve resolver a lide nos exatos limites da demanda, não podendo se posicionar além do que foi pedido (ultra petita), nem aquém (citra ou infra petita), tampouco dele se alhear (extra petita), sob pena de nulidade do ato decisório, ressalvadas as matérias cognoscíveis de ofício. 2. Considerando a falta de apreciação dos pedidos que foram declinados na petição inicial, somado ao fato de que na sentença foram contemplados pedidos outros não mencionados pelo autor em sua petição inicial, configurando julgamento citra e extra petita, sua nulidade é medida que se impõe. Possível o reconhecimento ex officio do vício no julgamento. 3. A sentença extra e citra petita não pode ser reformada, devendo ser anulada, para que a questão seja novamente apreciada pelo Juízo natural, pois, a não observância ao princípio da congruência, implica o cerceamento da defesa. 4. Preliminar suscitada de ofício acolhida. Sentença desconstituída. Apelação prejudicada. (Acórdão 1205648, 07382540220188070001,
Relator: ALFEU MACHADO, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 25/9/2019, publicado no DJE: 9/10/2019. Pág.: Sem Página Cadastrada.).
Diante do exposto, por ser matéria de ordem pública, este Graduado
Poder Judiciário
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Gabinete do Desembargador Ernesto Anselmo Queiroz Chíxaro
Órgão Ministerial opina pela decretação da nulidade da sentença, por ser citra petita, restando assim, prejudicado o mérito recursal.
É o parecer.
Manaus, 27 de Fevereiro de 2020.
SANDRA CAL OLIVEIRA
Procuradora de Justiça"
Pois bem, em razão da imprescindibilidade de estudo psicossocial para fixação da guarda, restou configurado o julgamento citra petita da ação de origem, sendo necessária a declaração integral de nulidade da decisão.
Nesse sentido, trago o entendimento do STJ sobre o tema:
AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. JULGAMENTO CITRA PETITA. 1. Encontra-se em harmonia com a jurisprudência desta Corte o acórdão que determina a cassação da sentença proferida com julgamento citra petita. Incidência do óbice da Súmula 83/STJ. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 798.893 - RJ (2015/0264437-0) Relatora Ministra Maria Isabel Gallotti Data do Julgamento:16 de fevereiro de 2017)
3. Dispositivo.
Diante do exposto, conheço do presente recurso voluntário e, no mérito, dou provimento a fim de anular a sentença, determinando o retorno dos autos à origem para os devidos fins.
É como voto
Manaus/AM, _____ de __________ de 2020.
Desembargador Ernesto Anselmo Queiroz Chíxaro
Relator