Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

STJ: Leitura dos antecedentes do acusado em plenário não é causa de constrangimento ilegal

segunda-feira, 31 de agosto de 2020, 17h31

Diz o art. 478 do CPP:

“Durante os debates as partes não poderão, sob pena de nulidade, fazer referências: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)

I – à decisão de pronúncia, às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)

II – ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento, em seu prejuízo. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008)”.

 

Há quem sustente que a proibição se estenda a outros temas que não apenas aqueles relacionados no dispositivo.

 

É a lição de Gustavo Henrique Badaró, ao destacar que “se a leitura do decreto de prisão preventiva ou da folha de antecedentes for feita com o objetivo de extrair uma ‘presunção de culpa’, haverá indevida influência no julgamento dos jurados e eventual veredicto condenatório será nulo. O art. 478 não constitui uma hipótese de numerus clausus. Não será apenas, única e exclusivamente, com essa finalidade que os jurados serão influenciados. Qualquer outra linha argumentativa, com finalidade persuasiva, mas que possa induzir o jurado a erro, implicará nulidade de julgamento. A diferença é que, nas hipóteses dos incisos I e II do novo art. 478, demonstrada a situação de base – o acusado foi pronunciado, ou o acusado está algemado, ou, ainda, o acusado permaneceu em silêncio, o que indica que seja culpado –, haverá nulidade, posto que o legislador, previamente, considera que neste caso haverá evidente prejuízo. No entanto, em qualquer outra hipótese, desde que se demonstre concretamente que linhas argumentativas seguidas pelas partes efetivamente influenciaram, de forma indevida e falaciosa, o convencimento dos jurados, a nulidade também será de se reconhecer. Aliás, mesmo antes do novo dispositivo, era isso o que a jurisprudência fazia no tocante a indevido argumento de presunção de culpa a partir da ‘periculosidade’ do acusado que estivesse algemado” (Processo Penal. Rio de Janeiro: Campus: Elsevier, 2012, p. 510).

 

Ousamos discordar. Primeiro, porque tendo o legislador relacionado todos os temas que não podem ser suscitados em plenário, significa dizer que, somente em relação a eles há o impedimento. Quisesse estender a limitação a outras hipóteses (leitura do decreto de prisão preventiva ou da folha de antecedentes, por exemplo), e o teria feito expressamente. Ou, então, deixado uma cláusula em aberto, para a análise no caso concreto e não especificado os casos de pronúncia, decisões posteriores, algemas e silêncio do réu. Segundo, em virtude de que uma normaque restringe deve ser interpretada de forma restritiva. E, terceiro, em função da enorme dificuldade prática em se disciplinar os trabalhos, já que o juiz ficaria constantemente preocupado em reprimir o discurso das partes, amordaçando sua argumentação em franca violação aos princípios da ampla defesa e da ampla acusação e em detrimento do debate, que representa a verdadeira alma do Júri.

 

Nesse sentido, aliás, vem se posicionando a jurisprudência. O promotor de Justiça de SP, Dr. Rogerio Leão Zagallo, encaminhou ao CAO recente decisão do STJ confirmando nossa tese.

 

STJ- AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1815618 - RS EMENTA AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRIBUNAL DO JÚRI. JUNTADA DOS ANTECEDENTES DO RÉU. POSSIBILIDADE. ART. 478, I, DO CPP. ROL TAXATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A teor do art. 478, I, do Código de Processo Penal, é vedada a referência de certas peças que integram os autos da ação penal em plenário do Tribunal do Júri, a impingir aos jurados o argumento da autoridade. A jurisprudência desta Corte Superior é firme em assinalar que o rol previsto nesse dispositivo legal é taxativo. 2. A folha de antecedentes do acusado é peça que compõe a instrução processual de qualquer feito criminal e não há nenhum constrangimento em juntar tal documento aos autos. Ademais, o próprio Código de Processo Penal impõe que seja perguntado ao acusado, em plenário, sobre seus antecedentes criminais, nos termos da previsão do art. 474 do diploma processual penal, ao dispor sobre a aplicabilidade das disposições do art. 187 da lei adjetiva ao interrogatório no júri. 3. Agravo regimental não provido.

 

Inteiro teor

 

Fonte: CAOCRIM MPSP


topo