Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

O Júri no Banco dos Réus

quinta-feira, 06 de maio de 2021, 10h29

No plenário do Tribunal do Júri, sempre se destacou – como ainda se destaca em alguns países – o denominado banco dos réus. Como o próprio nome sugere, cuida-se de assento que é ocupado por quem foi pronunciado pelo Judiciário para ser julgado pelo povo.

 

Nunca é demais lembrar que alguém só é submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri se houver prova da existência de crime doloso contra a vida e indícios suficientes de autoria ou participação. Ou seja, não se trata de qualquer caso, pois é necessário que haja prova idônea para a condenação. Se não houver prova acima da dúvida razoável, o réu deverá ser impronunciado pelo Judiciário.

 

Logo se vê que o legislador delegou à magistratura togada o dever de filtrar o caso a ser submetido a julgamento popular.

 

Um veredicto, absolutório ou condenatório, será considerado injusto quando for manifestamente contrário à prova dos autos ou ao ordenamento jurídico. Em um Estado Democrático de Direito, os veredictos devem encontrar eco na legislação, sob pena de arbítrio.

 

Por isso, é fácil notar que, em regra, os erros judiciários recairão em absolvições absurdas, que não encontram o mínimo de amparo no conjunto probatório ou no ordenamento jurídico.

 

Vale dizer, se o veredicto for condenatório, dificilmente estará totalmente divorciado da prova constante no processo e a razão é muito simples: se não houvesse prova da materialidade e de indícios suficientes de autoria ou participação, o caso sequer seria julgado pelos jurados.

 

No início do ano 2000, surgiu forte movimento liderado por criminalistas pela extinção do banco dos réus no Tribunal do Júri, sob o principal fundamento de que tal violava o princípio da presunção de inocência. Após alguns anos, parece que conseguiram obter êxito no reclame, uma vez que, atualmente, em quase todos os plenários do Júri sediados no país, o réu tem o assento garantido ao lado de seu defensor.

 

Passado algum tempo, parece que o banco dos réus foi restabelecido, mas, agora, por incrível que pareça, não é mais o pronunciado que o ocupa. Alguns agentes do Legislativo e do Judiciário, respectivamente, no exercício legiferante e judicante, têm escalado como titular do banco dos réus o próprio Tribunal do Júri.

 

Vale dizer, nos últimos anos, muitos, com o dedo em riste, têm acusado o Tribunal do Júri de ser antiquado, anacrônico, burocrático, inoperante, contraproducente etc. Mas não se limitam a isso. Avançam para atacá-lo em sua essência. Tentam desvirtuá-lo para atender interesses, no mínimo, questionáveis. 

 

Assim, desde o advento da Lei 11.689/2008, há o patrulhamento legislativo da linha de argumentação das partes, em clara violação à liberdade de expressão dos tribunos, sobretudo do membro do Ministério Público, e de informação dos jurados, em prejuízo da soberania dos veredictos. São dos debates livres de ideias entre as partes que surgirão as decisões dos jurados.

 

Daí que basta olhar para a Constituição Federal para verificar a eloquente inconstitucionalidade do artigo 478 do Código de Processo Penal. Ora, é inadmissível trabalhar com meias verdades, quando estão em jogo a vida, liberdade, justiça e soberania popular.  

 

Mas os ataques não param por aí. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal limitou a utilização de tese junto ao Conselho de Sentença (ADPF 779). E, agora, o Projeto de Lei n. 8045/2010 (NCPP) destrói a sua imagem tradicional, ao descaracterizar o clássico procedimento bifásico. Além disso, impõe nova limitação argumentativa, ao restringir a utilização da prova colhida na primeira fase da persecução penal do Estado. E não para por aí. Estabelece uma quesitação, e consequente votação, altamente burocrática, consistente em verdadeira usina de nulidades. 

 

Na realidade, arma-se arapuca legislativa para caçar a justiça e, assim, prevalecer a impunidade nos crimes de sangue.

 

Há muito tempo, Rui Barbosa, grande advogado do - e não no - Tribunal do Júri, que sempre o defendeu com o cérebro, as unhas e os dentes, advertiu sobre as ameaças dos reformadores que buscam, não seu aperfeiçoamento, mas a sua destruição. Os acusadores estão firmes e fortes nesse propósito e, ao que tudo indica, pedem a pena máxima, qual seja, a pena capital, a morte do Tribunal Popular.

 

É tempo de resistência! É tempo de união! É tempo de luta! É preciso que os verdadeiros entusiastas da Instituição do Júri reúnam forças (im)possíveis e necessárias para defendê-lo, como Rui Barbosa o defendeu. 

 

Por César Danilo Ribeiro de Novais, Promotor do Tribunal do Júri. 

 

* Sugiro a leitura do livro "O Tribunal do Júri no Banco dos Réus" de Lara Ferreira Lorenzoni, que aborda a instituição sob outra perspectiva.

 

 

Fonte: Blog Promotor de Justiça


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