Artigo: A aplicação da Lei da Pessoa com Deficiência no Mercado de Trabalho
quarta-feira, 15 de junho de 2022, 14h27
A história das pessoas com deficiência é marcada por preconceito e exclusão e foi necessário muitas lutas e mudanças sociais para que tais indivíduos fossem tratados como cidadãos iguais aos demais, tendo acesso aos mesmos direitos e deveres. Há de se considerar, que, mesmo após séculos, pessoas com deficiência continuam tendo dificuldades de adentrar ao mundo do trabalho e sofrendo preconceitos em diferentes setores sociais. Foi diante da observação do mercado de trabalho, assim o presente artigo com método dedutivo, documental e interdisciplinar, debruçar-se-á sobre normas, leis e doutrinas que disciplinam a matéria para melhor compreender os princípios legais e normativos para uma fiscalização e uma maior aplicabilidade dentro do mercado de trabalho. Buscando responder quais as repercussões da lei 13.146 para inclusão de pessoas com deficiência nos contratos de trabalho? Para isto, foi feita uma discussão bibliográfica com base em autores como Piovesan (2009), Neves e Araújo (2017), Lôbo (2016), dentre outros autores que discutem essa questão observa-se que o Estatuto da Pessoa com Deficiência é um sistema normativo altamente inclusivo, sendo considerado uma conquista social, nesse sentido, conclui-se que apesar de todos desafios enfrentados pela pessoa com deficiência no mercado de trabalho, a lei 13.146/2015, além da lei de cotas, trouxe grandes avanços e dados positivos, são 400.000 mil brasileiros empregados formalmente uma conquista para estas pessoas.
Fonte: Leidiane Batista Silva
1 INTRODUÇÃO
Desde os primórdios da sociedade, tudo aquilo que contraria o padrão estabelecido acaba recebendo um olhar negativo e sendo segregado e com as pessoas que apresentam deficiência não foi diferente. Ainda hoje em tempos atuais onde as informações são relativamente fáceis e a todo tempo está a nossa frente esses indivíduos padecem da exclusão social, sendo necessário uma luta diária em prol da preservação de seus direitos na sociedade em que se vivem. De acordo com Piovesan (2009), ao analisar a história da pessoa com deficiência fica nítido como, por séculos, elas foram alvo de todo tipo de preconceito e segregação, havendo momentos na história que diferentes povos até mesmo exterminavam tais indivíduos por considerarem-nos como um castigo divino.
A sociedade, com o passar dos séculos, porém, foi modificando-se, adquirindo novas características e um olhar diferenciado sobre as pessoas com deficiência que ganharam direitos, principalmente na área da educação e no mundo do trabalho. Tais mudanças, porém, de acordo com Neves e Araújo (2017), não conseguiram fazer com que tais indivíduos fossem, plenamente, incluídos na sociedade, pois ainda hoje preconceitos e formas diferenciadas de segregação continuam a existir, impedindo, especialmente, que uma pessoa com deficiência possa adentrar ao mundo do trabalho e exercer sua cidadania.
O interesse pelo tema surgiu diante da observação de que as pessoas com deficiência mesmo sendo tratadas como sujeitos de direitos, sendo consideradas como capazes de seus atos da vida civil e com plenas condições para exercer trabalhos, administrar patrimônios, constituir família, ter acesso a instituições de ensino, enfim, construir sua autonomia e efetivamente exercerem sua cidadania, continua a ser alvo de preconceitos e formas diferenciadas de segregação na sociedade brasileira e isto é claramente evidente dentro do mercado de trabalho, onde poucas são as instituições que empregam esses indivíduos e cumprem a lei que obriga as instituições a empregarem pessoas com deficiência.
Diante de tal contexto, o presente estudo busca analisar a aplicação da lei da pessoa com deficiência no mercado de trabalho, enfocando os reflexos da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) e assim responder a seguinte problemática: Quais são as repercussões jurídicas da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) para inclusão de pessoas com deficiência nos contratos de trabalho?
Em vista disso, observa-se que o Estatuto da Pessoa com Deficiência é um sistema normativo altamente inclusivo, sendo considerado uma conquista social, porém, nem tudo o que nele é estabelecido tem sido, efetivamente colocado em prática na sociedade. É inegável o intuito humanitário e isonômico deste documento, cujo principal objetivo é afastar os rótulos e estigmas que historicamente acompanharam a pessoa com deficiência e a colocação do deficiente em plena igualdade de direitos e deveres em relação aos demais cidadãos no mercado de trabalho.
O tema demonstra-se socialmente relevante no sentido de que toda sociedade deve contribuir para o processo de inclusão, lutando contra preconceitos, buscando assegurar direitos e fazer com que todas as pessoas sejam tratadas da mesma forma. Além disso, traz profundas contribuições para que as pessoas com deficiência compreender melhor seus direitos, como eles foram adquiridos, de que forma tem sido colocados em prática e as dificuldades encontradas nessa efetivação.
O objetivo principal do desenvolvimento deste projeto de pesquisa é discutir a aplicação da lei da pessoa com deficiência no mercado de trabalho. Para que isto seja possível busca-se abordar os principais direitos reconhecidos da pessoa com deficiência no mercado de trabalho brasileiro, deixando em evidência quais os direitos assegurados a toda e qualquer pessoa humana. Seguidamente discorrer-se-á sobre a própria pessoa com deficiência, indagando a respeito da proteção jurídica assegurada à está dentro do mercado de trabalho, no cenário que se desenvolveu com o decorrer dos séculos; posteriormente pretende-se fazer argumentações em torno do papel desenvolvido pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência para inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho e de qual modo este agiria como um diploma legal garantidor dos princípios fundamentais de tal direito.
A pesquisa tem como metodologia a pesquisa qualitativa bibliográfica, realizada através de livros e artigos científicos. A pesquisa qualitativa “fornece ao pesquisador uma noção de existência das formas diversas de conhecimento entre pessoas leigas de grupos distintos: fornecendo também ideias sobre a quantidade de conhecimento produzida, transformadora e transmitida” (FLINCK, 2009, p. 63). Assim, permite compreender melhor como os preconceitos e as lutas travadas por pessoas com deficiência durante a história e como estas desembocaram na lei de inclusão desses indivíduos no mercado de trabalho.
A pesquisa pautou-se ainda em uma pesquisa do tipo exploratória. Segundo Piovesa (1995), a pesquisa exploratória é utilizada quando se pretende realizar um estudo preliminar do principal objetivo da pesquisa a ser realizada. Dessa forma, o pesquisador pode se familiarizar com o fenômeno em questão, de modo que a pesquisa subsequente sobre o mesmo tema possa ser arquitetada com mais compreensão e precisão. Dessa maneira permite um olhar mais aprofundado sobre a posição do indivíduo com deficiência na sociedade brasileira, as dificuldades histórias pelas quais ele passou, como a lei de inclusão tem sido aplicada nas instituições empresariais brasileiras, os benefícios desse processo, assim como as barreiras e dificuldades encontradas.
Utiliza-se também na pesquisa o método dedutivo, que segundo Menezes (2020) envolve um conceito utilizado em diferentes áreas e que se relaciona com distintas formas de raciocínio. Nesse processo é feita uma análise de informação e a partir destas chega-se a uma conclusão, assim, utiliza-se uma dedução para encontrar um resultado final.
2 CONTEXTO HISTÓRICO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA NO BRASIL
2.1 Da Exclusão a Proposta de Inclusão
A compreensão da educação inclusiva exige que seja feita uma contextualização histórica em torno da forma como o deficiente foi excluído e inserido nos diferentes períodos da história da humanidade. Para Rodrigues e Lima (2017), dados encontrados na bíblia, por exemplo, demonstram que ouve dois agrupamentos diferenciados na sociedade, a nobreza (senhores que detinha o poder social, econômico e político) e o restante da população, que eram considerados como inferiores e dependiam economicamente da nobreza. O valor do homem nesse período era advindo de suas características pessoais e de sua utilidade na sociedade, por isto, todo aquele que era considerado como diferente era exterminado do meio pela forma do abandono. De acordo com os autores “a pessoa deficiente, era excluída em razão da sua deficiência, associada a uma “ineficiência”, pois, não seria “produtiva” para a nobreza. Assim, nada podia ser feito, e só restava a aceitação dessa condição” (RODRIGUES e LIMA, 2017, p.23).
Ainda de acordo com Rodrigues e Lima (2017), a bíblia faz referência a cegos, manco, leprosos, pessoas que por suas condições físicas tornavam-se pedintes ou rejeitadas, considerados como amaldiçoados pelos deuses. As pessoas que apresentavam deficiência mental eram tratadas como bobos, palhaços e serviam até mesmo de diversão par senhores e seus hospedes.
As diferenças sempre fizeram parte da humanidade e elas evidenciam as diferentes formas que o homem atua sobre o espaço e vive sobre o mesmo. De acordo com Lôbo (2016, p.15) “as pessoas são diferentes em praticamente tudo. As pessoas com deficiência são apenas pessoas diferentes, com limitações impostas pela sociedade que ainda não acabou com todas as barreiras” e sua luta por igualdade e pelo fim do preconceito é secular e tem buscado se efetivar na construção de leis que precisam ser colocadas em prática.
Dessa forma, a existência do preconceito contra aqueles que são “diferentes” faz com que algumas pessoas sejam consideradas anormais, sendo alvo de segregação e em muitos momentos da história tenham sido excluídos de direitos sociais. Para Diniz (2007, p. 08), “a anormalidade é um julgamento estético e, portanto, um valor moral sobre os estilos de vida” e foi utilizado em vários momentos da história, onde, em muitos povos, o indivíduo que nascia com deficiência chegou a ser exterminado e tratado como maldição.
No Egito antigo, por exemplo, as pessoas com deficiência eram integradas de diferentes formas nas classes sociais, as pessoas com nanismo, por exemplo, podiam ocupar cargos, ofícios e ocupações diferenciadas. Era um povo onde não tinha tantos preconceitos, principalmente pela grande presença de pessoas cegas, é o que afirma Gurgel (2007).
Os gregos, porém, mostravam-se preconceituosos e de acordo com Gurgel (2007), aqueles que nasciam “disformes”, deveriam ser eliminados da sociedade. Era comum o abandono e até mesmo que crianças com deficiência fossem atiradas de montanhas. A mesma situação podia ser vista entre os romanos, onde os pais tinham permissão para matar as crianças que nasciam com deformidades físicas, o que era permitido na forma de afogamento.
Na Idade Média, os indivíduos com deficiência eram vistos como pessoas castigadas por Deus, houve superstições de pessoas que acreditavam que eles possuíam poder especiais, sendo feiticeiros ou bruxos. Chegando-se a Idade Moderna, porém, ensinamentos de diferentes áreas geraram um novo olhar sobre as pessoas com deficiência, o que foi possível, especialmente com a Revolução Francesa. Pouco tempo depois, Gerolamo Cardomo dava origem a um código para ensinar pessoas surdas a lerem e escrever, demonstrando a maior preocupação social com essas pessoas (SILVA, 1986).
Com o surgimento do Cristianismo e o fortalecimento da Igreja Católica, surge um novo grupo no cenário político, o clero. Ao povo restava o trabalho e o clero, assim como a nobreza ficaram com enriquecimento e poder. De acordo com Aranha (2005) as pessoas que eram doentes, consideradas como defeituosas e mentalmente afetadas já não podiam mais ser exterminadas, porém, eram totalmente dependentes da caridade de outras pessoas. Havia ainda o hábito de uso das pessoas “diferentes” como uma fonte de diversão e também para exposições que chamavam a curiosidade dos outros cidadãos.
A partir do século XII, a Inquisição Católica assim como a Reforma Protestante, fizeram com que o poder da igreja se expandisse entre as pessoas, porém, também haviam contradições entre o discurso religioso e as ações daqueles que estavam à frente da igreja, já que o clero, especialmente era abusivo. De acordo com:
Nesse panorama estabelecido, o poder exercido Igreja passou a ficar ameaçado, desencadeando um dos piores momentos da história, onde, qualquer suspeita de posicionamento contrário à igreja, era fortemente condenado sob forma de perseguição ou extermínio, inclusive, até a morte pela fogueira. Constam em documentos da Igreja que as pessoas com deficiência, principalmente a deficiência mental, também representavam uma ameaça contra a Igreja. Se na Antiguidade a pessoa deficiente era esquecida e praticamente “não existia”, no período medieval, a questão era talvez, pior, pois no plano da metafísica, de natureza religiosa, a pessoa com deficiência era considerada “demoníaca”. (Neves e Araújo, 2017, p.04).
Após esse período de maior influência da igreja, destaca-se a Revolução Burguesa, e esta fez com que o poder religioso na sociedade entrasse em queda. Foi a Revolução Burguesa a responsável pelo desenvolvimento do capitalismo mercantil e a deficiência passou a ser tratada como algo ligado à natureza orgânica, com causas naturais e houve o uso da alquimia, magia, astrologia e outros meios incipientes a medicina. No século XVII, porém, a medicina avança e ela contribuiu para que se visse a deficiência como algo natural e juntamente com a tese do desenvolvimento por meio da estimulação, as pessoas com deficiência passaram a ter outro tratamento (ARANHA, 2005).
Foi no século XX, porém, que as pessoas com deficiência tiveram um avanço importante em sua participação e visão da sociedade sobre si. Na Europa, por exemplo, de 1902 a 1912, surgiram instituições de formação de pessoas com deficiência, a partir daí, surgiram lei, serviços, instituições especializadas e inúmeros movimentos em prol do reconhecimento dos direitos desses indivíduos (SILVA, 1986).
Em 1948, é promulgada a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, onde seu artigo 1 considera “todas os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade”, a partir daí diferentes direitos, não apenas para as pessoas com deficiência passaram a ser alvo de políticas públicas e da ação governamental (BRASIL, 1998).
Esse breve contexto histórico deixa nítido como as pessoas com deficiência, historicamente foram tratadas como pessoas inferiores e excluídas socialmente. Atualmente, possuem inúmeros direitos garantidos com base nas políticas nacionais e internacionais e tais políticas referem-se, especialmente ao mundo da educação e do trabalho, onde, historicamente tais indivíduos foram segregados e não tiveram seus direitos respeitados.
2.2 O Conceito de Pessoa com Deficiência e os Direitos Humanos
Para a melhor compreensão da questão, é preciso compreender o conceito de deficiência que é bastante variado. A Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (CDPD) traz o seguinte conceito:
A deficiência é um conceito em evolução e que a deficiência resulta da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras devidas às atitudes e ao ambiente que impedem a plena e efetiva participação dessas pessoas na sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. (CDPD, BRASIL, 2009)
Mas, não há de se falar em diferença, pois, como afirmado na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, pessoas com deficiência são pessoas. Nesta mesma Convenção, postula-se o conceito de deficiente como um termo em constante transformação, pois acompanha, também, as mudanças sociais. No caso da Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes, o documento objetiva assegurar a proteção dos direitos daqueles que se encaixam nessa conceituação. A exemplo, colaciona-se os artigos 2, 3 e 10, in verbis desse documento que afirmam como o indivíduo com deficiência deve gozar de todos os direitos dos demais cidadãos, não havendo distinção nem de raça nem de sexo, cor, dentre outras (art.2) e ainda:
Artigo 3. As pessoas deficientes têm o direito inerente de respeito por sua dignidade humana. As pessoas deficientes, qualquer que seja a origem, natureza e gravidade de suas deficiências, têm os mesmos direitos fundamentais que seus concidadãos da mesma idade, o que implica, antes de tudo, o direito de desfrutar de uma vida decente, tão normal e plena quanto possível.
Artigo 10. As pessoas deficientes deverão ser protegidas contra toda exploração, todos os regulamentos e tratamentos de natureza discriminatória, abusiva ou degradante. (Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015)
A partir destes princípios de lei, é preciso destacar que o trabalho, que é um dos mais importantes elementos de cidadania na sociedade, isto porque ele oferece oportunidades para que o homem busque seu sustento e de sua família, sinta-se útil e ainda possa trazer contribuições para a sociedade em que vive. Silva et al (2015) afirmam que mesmo que existem vários instrumentos legais que incentivem a empregabilidade de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, esses cidadãos continuam a encontrar inúmeras dificuldades nesse ingresso, tendendo a receber menores salários assim como a realizar trabalhos considerados de menor importância.
É preciso considerar que o conceito de deficiência teve diferentes abordagens ao longo da história da humanidade e de acordo com Piovesan (2009) este não se trata, a priori, de um conceito abstrato, mas da forma como a pessoa com deficiência foi encarada, assim como incluída dentro de diferentes realidades sociais. Para o autor “a perspectiva a qual era entendida a deficiência e as causas de sua existência influenciam diretamente a aceitação e a participação dessas pessoas na sociedade” (p.02).
Assim, Piovesan (2009) afirma que poderia se definir quatro estágios no processo de construção dos direitos das pessoas com deficiência. No primeiro estágio, houve uma total intolerância a essas pessoas, considerando-as como seres impuros, castigados por deuses. No segundo estágio, vivenciou-se um processo de invisibilidade, onde essas pessoas eram segregadas em guetos, separadas da sociedade. No terceiro estágio, possivelmente aquele mais vivenciado no Brasil, tem-se o processo de assistencialismo, onde avança a medicina e busca- se cura para as limitações. Sobre a última fase o autor cita:
A fase que ora se apresenta tem foco nos direitos humanos e na inclusão da pessoa com deficiência de maneira plena em todas as searas sociais. Quem deve ser tratada agora, em que pese a extrema importância da continuidade das pesquisas cientificas que visam minorar limitações, é a sociedade. A doença, na expressão pejorativa da palavra, não está mais centrada na pessoa, mas sim na sociedade que tem profundas dificuldades de lidar com as diferenças, com qualquer pessoa que destoe dos padrões vigentes (PIOVESAN, 2009, p.36).
Há assim um conceito contemporâneo de deficiência, assim como de direitos para as pessoas com deficiência, tudo amparado na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da Organização das Nações Unidas.
Quando se fala em direitos humanos, cita-se que eles envolvem a busca por superações das limitações e há de se considerar que na sociedade, alguns grupos possuem características e vivenciam situações que fazem com que sofram diferentes tipos de limitações aos seus direitos. Foi diante dessa situação que a ONU criou as Convenções Internacionais específicas para tratar desses grupos considerados como menos favorecidos. Nesse contexto, Araújo e Ferraz (2010), afirmam que é importante definir o ser humano que possui uma deficiência, mesmo que isto seja uma tarefa difícil. Quando se busca igualdade material entre as pessoas, entende-se que a dignidade humana só é alcançada a partir do momento que todo tipo de barreira que impede seu desenvolvimento possa ser eliminado e para isto cria-se mecanismos que venham a efetivar o processo de igualdade.
3 A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E A PESSOA COM DEFICIÊNCIA
3.1 A Inclusão e seus Desafios nas Empresas de Trabalho.
Analisar a legislação brasileira em torno da pessoa com deficiência é algo importante para compreender o percurso histórico desses indivíduos e a conquista de direitos ao longo da história. De acordo com Mari (2013), atualmente são cerca de 45,6 milhões de pessoas que vivem no Brasil e que possuem algum tipo de deficiência, cerca de 23,91% da população brasileira. Se tantas pessoas possuem deficiência e se esse número representa tanto na sociedade brasileira, é preciso buscar formas para que a sociedade seja justa, igualitária e inclusiva, para todos os cidadãos.
O maior cuidado para com os direitos das pessoas com deficiência foi tratado na “Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão”, elaborada em 1948 e na Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes de dezembro de 1975, da Organização das Nações Unidas. Em dezembro de 1982, a ONU promulgou também a Resolução 37/52, conhecido como Programa de Ação Mundial para as Pessoas com Deficiência, onde define-se as ações nacionais e internacionais, assim com pesquisa, controle e avaliação do programa. De acordo com:
A ONU propõe a construção de uma sociedade para todos em 20 anos por meio da Resolução 45/91 em 14 de dezembro de 1990 escrevendo da seguinte forma: ”A Assembleia Geral solicita ao Secretário-Geral uma mudança no foco do programa das Nações Unidas sobre deficiência passando da conscientização para a ação, com o propósito de se concluir com êxito uma sociedade para todos por volta do ano 2010. (Mari, 2013, p.06).
De acordo com Araújo e Ferraz (2010), muitas vezes faz-se um elo entre a deficiência com a limitação, porém, é um conceito que pode referir-se a todos os seres humanos, já que em maior ou menor grau, todos eles possuem diferentes tipos de limitações, sejam elas físicas, psicológicas ou mentais:
Somos limitados por natureza e a aceitação de nossa limitação é o primeiro passo para a efetivação de nossa dignidade. Não seria então a limitação que caracterizaria a deficiência em si, mas as barreiras impostas pela sociedade que impedem o pleno desenvolvimento dos seres humanos com os atributos a estes inerentes (ARAÚJO e FERRAZ, 2010, p.04).
Assim, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência foi adotado pela organização das Nações Unidas em 13 de dezembro de 2006, baseando-se na Resolução 61/106 da Assembleia Geral. A convenção, porém, só veio a entrar em vigor em maio de 2008, sendo que no Brasil foi aprovada com quórum qualificado, publicada no Decreto 186/2008 no Diário Oficial da União.
A Convenção citada reconhece que o conceito de deficiência está em constante evolução, isto porque a sociedade, também, está em constante mudança. O que é claro na atualidade, é que a deficiência também tem ligação com o meio em que o indivíduo vive, uma vez que a ele são oferecidos diferentes tipos de barreiras impedindo-se de exercer sua cidadania e viver como um ser humano igual a qualquer outro. Assim, Araújo e Ferraz (2010) lembram que mais do que fatores biológicos é preciso levar em consideração a cultura da sociedade na qual esse indivíduo está inserido. Assim sendo, “tais impactos irão emergir no momento da criação de políticas públicas garantidoras dos direitos humanos destes cidadãos [...] o conceito é inovador por agregar o meio ambiente social e econômico como fator que agrava a deficiência”.
Outra questão importante para a qual a Convenção chamou a atenção é para o fator discriminação, pois ele limita a participação do indivíduo com deficiência na sociedade, agindo diretamente sobre sua dignidade e impedindo-o de ter maior autonomia e de fazer suas próprias escolhas, o que fica bastante nítido, por exemplo: Nos contratos de Trabalho.
Em 1993, foram criadas as “Normas sobre Equiparação de Oportunidades para Pessoas com Deficiência” da ONU, estas que foram emitidas através da Resolução 48/96, onde estabelece-se requisitos, normas e medidas para que haja maior igualdade na participação na educação, emprego, renda e seguro social, acessibilidade, vida familiar e integração pessoal, assim como na área de esportes, religião, pesquisa, políticas públicas, legislação, etc.
Em 1994, foi criada a Declaração de Salamanca (ONU), onde passou-se a tratar de procedimentos, assim como de padrões que fossem capazes de equalizar as oportunidades para pessoas com deficiência, estabelecendo princípios, políticas e práticas na área da educação especial e cobrando dos Estados a educação para pessoas com deficiência dentro de seus sistemas educacionais. No ano de 1999 foi aprovada a Carta para o Terceiro Milênio, em Londres na Grã-Bretanha. O objetivo do documento é criar medidas capazes de promover o empoderamento e inclusão social, buscando apoio dos países para intensificar a luta pelos direitos das pessoas com deficiência, sendo esta uma estratégia-chave do programa (MARI, 2013).
No ano de 1996, a Instrução Normativa nº 7 de 21 de março passou a disciplinar o exercício do direito das pessoas com deficiência se inscreverem em concurso público para provimento de cargos, devendo ter atribuições compatíveis com suas deficiências. Já a Lei nº 9.527 de 10 de dezembro de 1997 faz referência a concessão de horário especial aqueles servidores que possuem deficiência, desde que ela seja comprovada por junta médica oficial (MARI, 2013).
Em 25 de setembro de 1999, foi criada a Declaração de Washington cujo objetivo era criar o compromisso com aquilo que havia sido assumido na Conferência de Cúpula “Perspectivas Globais sobre Vida Independente para o Próximo Milênio” do Movimento de Direitos das pessoas com Deficiência. Dois anos depois, em 05 de junho de 2001 foi aprovada a Declaração Internacional de Montreal tratando da inclusão e propondo a criação de uma “sociedade inclusiva”, propondo desenhos inclusivos em ambientes, produtos e serviços. Ainda são marcos importantes a serem citados:
Em 23 de março de 2002 é aprovado Parâmetros para construção da sociedade em Madri, Espanha, no Congresso Europeu de Pessoas com Deficiência, comemorando a proclamação de 2003 como o Ano Europeu das Pessoas com Deficiência. Aprovada no dia 18 de outubro de 2002 - DPI – Declaração de Sapporo – Mudanças na Sociedade, realizada por 3.000 pessoas, em sua maioria com deficiência, representando 109 países, por ocasião da 6ª Assembleia Mundial da Disabled Peoples’ International – DPI, realizada em Sapporo, Japão. (Mari,2013, p.07).
Em 18 de outubro de 2002 é promulgada a Declaração de Caracas, compondo as Resoluções da Rede Ibero-Americana de Organizações Não-Governamentais de Pessoas com Deficiência e suas Famílias. Em agosto de 2006 foi realizada a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
Há ainda uma farta relação de instrumentos legais brasileiros que abordam e normatizam questões ligadas às pessoas com deficiência. A Carta de 1988 por, foi considerada o marco jurídico da transição ao regime democrático, visito que aumentou os direitos e garantias fundamentais, assegurando o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça, como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos. A inovação trazida pela Carta de 1988 aumenta os direitos e garantias, não apenas os direitos civis e políticos, mas também os sociais. (Mari 2013, p.08).
Não há dúvidas, porém, que é a Constituição Federal de 05 de outubro de 1988 uma das mais importantes para a configuração das demais legislações brasileiras, pois é ela que serve de tripé para os demais decretos, leis, portarias e resoluções oficiais que passaram a referir-se a pessoas com deficiência. São inúmeros os artigos que tratam da questão da inclusão da pessoa com deficiência e no artigo 37, III, por exemplo, estabelece-se que “a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas com deficiência e definirá os critérios de sua admissão”, no capítulo II “Dos Direitos Sociais”, o art.7º proíbe qualquer tipo de discriminação em relação a salário e critérios de admissão para o trabalho da pessoa com deficiência.
Em 2008, Mari (2013) cita o lançamento do Projeto Nacional de Incentivo à Aprendizagem de Pessoas com Deficiência do Ministério Público do Trabalho (MPT) e Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), onde além de vagas, prevê-se a necessidade de que haja um contrato de aprendizagem cujo objetivo é promover o treinamento e qualificação dessas pessoas, o que facilitaria sua inclusão no mercado de trabalho. No art. 7º, XXXI, da CF está expresso, que se proíbe a discriminação na contratação da pessoa com deficiência no contrato de trabalho, assim se efetiva o direito fundamental e sua efetiva integração social nos meios de trabalho, ainda se dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Como o art. 93 da lei 8213/91:
Da Habilitação e da Reabilitação Profissional
A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na seguinte proporção:
I - até 200 empregados 2%;
II - de 201 a 500. 3%;
III - de 501 a 1.000 4%;
IV - de 1.001 em diante 5%.
§ 1o A dispensa de pessoa com deficiência ou de beneficiário reabilitado da Previdência Social ao final de contrato por prazo determinado de mais de 90 (noventa) dias e a dispensa imotivada em contrato por prazo indeterminado somente poderão ocorrer após a contratação de outro trabalhador com deficiência ou beneficiário reabilitado da Previdência Social. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)
§ 2o Ao Ministério do Trabalho e Emprego incumbe estabelecer a sistemática de fiscalização, bem como gerar dados e estatísticas sobre o total de empregados e as vagas preenchidas por pessoas com deficiência e por beneficiários reabilitados da Previdência Social, fornecendo-os, quando solicitados, aos sindicatos, às entidades representativas dos empregados ou aos cidadãos interessados. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)
§ 3o Para a reserva de cargos será considerada somente a contratação direta de pessoa com deficiência, excluído o aprendiz com deficiência de que trata a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015)
§ 4o (VETADO). (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência) (lei 8213/91)
Os Contratos de trabalho para as pessoas com deficiência, tem seus amparos legais pela lei não trazendo distinções, mas sim assegurando que a pessoa com algum tipo de limitações ou seja deficiência, seja ela der qualquer natureza possa ser inclusa, de maneira que essas empresas se adapte as necessidades destas pessoas e cumpram a rigor as leis que muitas das vezes não tem uma fiscalização e um rigor para seu cumprimento, estas empresas que não se importam em adaptar e incluir a igualdade nessa inclusão, e sim deixe a cargo das próprias pessoas com deficiência que estas se adaptem a vaga ou o contrato estabelecido por elas , isso acaba que muitos desistam de procurar empregos, se isolam e desistem por receio pelas dificuldades imposta. Ainda com tantas leis para amparar estas pessoas, estas empresas não são punidas devidamente pelos seus atos em relações a estas contratações, e até mesmo em preconceitos seja ele por serem mulheres, de raça ou cor, e também a acessibilidade que é um grande obstáculo seja nas empresas ou nas vias públicas de acesso, já que ainda estes acessos é muito precária no nosso pais, limitando estas pessoas de acordo com o grau da deficiência e também relativamente está ligada ao sua condição socioeconômica.
Esperasse que políticas de socialização, de incentivo fiscal, de incentivo social para inserir estas pessoas no Contrato de trabalho tenha um maior avanço de inclusão com base nas constituição, dos tratados e convenções, da lei LBI (Lei Brasileira de Inclusão de 2015) e da lei de cotas , já se nota que são grandes os aspectos de mudança no mercado de trabalho em relação as estas pessoas com deficiência, já que maior parte destas se encontram desempregadas e desamparadas socialmente por vários fatores, então recentemente a vários questionamento sobre estas conquistas.
Dados apontam que com base na lei de cotas, seriam destinadas mas de 01 milhão de vagas de trabalho para pessoas com deficiência, analisando essas informações sociais que estão disponíveis, pela RAIS do Ministério da Economia, que e basicamente o registro dos vínculos formais ou de carteira de trabalho, se nota que esse número e muito pequeno ao qual a lei foi esperada , pois quando esta empresas comunicam que está contratando o trabalhador com deficiência, percebesse que há ainda desafios a serem enfrentados para a igualdade de todos no trabalho, pois se tem aproximadamente 400 mil trabalhadores registrados formalmente, menos da metade dos esperado de preenchimento das vagas ofertada pela lei de cotas, vemos que o retrocesso ainda se estagna, ainda há o descumprimento de desta lei , a falta de informações para estas pessoas, são dados que preocupam , já que há o mercado de trabalho formal e informal, assim sendo este número maior ainda do que os dados oficiais( DIESSE,2020).
A pandemia foi bastante severa para as pessoas com deficiência, os desligamentos foram maiores nessa fase, e pelos números de demissões durante este processo, as pessoas com deficiências já tinha dificuldades para se conquistar a inclusão e conseguir entrar no contratos de trabalhos, e com o aumento de desempregados o reflexo se torna maior para estas pessoas que tem desvantagens em relação a outras , muitas empresas falam em responsabilidade social, mas não se aplicam as pessoas com deficiências, então se vê que mesmo com um conjunto de leis para garantir a igualdade social e inclusão economicamente dessas pessoas na pratica não se vê nas coisas mais simples, exemplo: um cadeirante não consegue pegar um ônibus , tem que esperar por horas por um ônibus adaptado já q não são todos os ônibus que tem suporte para estas pessoas , se vê nas ruas e calcadas a dificuldade de locomoção, assim se conclui que o processo de estruturação para incluir estas pessoas do trabalho começa desde seu lar, trajeto e local de trabalho.
O Brasil tem várias conquistas que vem se efetivando na luta histórica para efetivar estes direitos desde 1982, assim sendo celebrado em 21/09 o dia nacional Da Luta da Pessoa Com deficiência, foi criada por decreto de lei nº 11.133 de 14 de Julho de 2005, essas conquistas foram historicamente obtidas por lutas das pessoas interessadas , ou seja da própria pessoa com deficiência, então vemos que existem várias entidades , programas , campanhas e órgãos que ajudam a estas pessoas para a importância destas leis, já que a deficiência ela além de ser concebida desde o nascimento , quando adquirida ao longo da vida, estas pessoas tem que ter a igualdade entre as outras pessoas e sua capacidade financeira e até emocional no mercado de trabalho.
4 PREVISÕES DA LEI nº 13.146, DE 6 DE JULHO DE 2015 (ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA) E REPERCUSSÕES NOS CONTRATOS DE TRABALHO
Quando se analisa a história das políticas públicas sociais e a legislação em torno da inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, observam-se diferentes discursos em torno da mesma questão. De acordo com Trevisoli (2013), existem pelo menos dois tipos de problemas em torno da contratação de pessoas com deficiência, uma é a falta de qualificação desses indivíduos e a outra é a necessidade de adequação de seu perfil as necessidades da empresa. De acordo com o autor, nem todas as áreas de uma empresa podem aproveitar uma pessoa com deficiência.
Ainda de acordo com Trevisoli (2010), em 2007, o Sistema Nacional de Emprego (SINE), ofertou 36.837 vagas de emprego, sendo que apenas 20% dessas (7.206) foram preenchidas. Especificamente em São Paulo, foram mais de 19 mil vagas oferecidas e pouco mais de 2 mil foram preenchidas. Sobre esse tipo de situação, se afirma que:
A explicação, do nosso ponto de vista, não é tão simples assim. Afirmar que esses dois fatores, por si só, são as causas da não contratação das pessoas com deficiência, é ignorar todo o contexto que envolve sua contratação, situações que extrapolam o tema formação profissional e barreiras arquitetônicas. (Rodrigues,2011)
Buscando explicar as inúmeras dificuldades que as pessoas com deficiência encontram no mercado de trabalho, Freitas (2009) afirma que há pelo menos três tipos de dificuldades para que a pessoa com deficiência seja inserida no mercado de trabalho: a maneira como os gestores das instituições veem a deficiência, a necessidade de adequação de condições e práticas de trabalho pelas empresas e ainda a necessidade de que a satisfação das pessoas com deficiência inseridas no mercado de trabalho seja avaliada. Diante desse contexto, Rodrigues (2011) cita o conceito de gestão da diversidade, que segundo o autor vem ganhando espaço na sociedade e nas empresas:
O conceito de “Gestão da Diversidade” vem ganhando espaço nas discussões realizadas pelos profissionais da área de Recursos Humanos (RH). Basicamente ele se refere à diversidade humana que compõe o quadro de funcionários da empresa, destacando que essa diversidade deve ser entendida como uma vantagem competitiva da empresa, ou seja, em último caso deve agregar valor ao produto oferecido (RODRIGUES, 2011, p.46).
Quando se fala em gestão da diversidade, remete-se a necessidade de que sejam tomadas ações em prol da inclusão de pessoas com deficiência nas instituições, estas que precisam basear-se em ações afirmativas2 que façam com que a lei seja cumprida, beneficiando pessoas que são minorias ou grupos que são excluídos. É um conceito que busca direcionar ações para diferentes identidades.
De acordo com Araújo e Schmidt (2006), as prioridades estabelecidas pelas empresas que visam ao lucro a qualquer custo fazem com que haja maiores dificuldades ainda de que pessoas com deficiência sejam empregadas. Os autores também definem algumas dificuldades nesse processo de inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho, citando que a maioria está ligada a própria empresa e poucas aos indivíduos com deficiência. Sobre tal questão:
O conjunto de todos os motivos apresentados inclui: baixa escolaridade (30%); pouca oferta de mão de obra (25%); qualificação profissional ruim (16%); problemas de espaço físico na empresa (9%); possíveis problemas de conduta (6%); resistência dos dirigentes da empresa (6%); falta de preparo da empresa para o recrutamento (4%) e outros motivos (4%). (Rodrigues,2011, p.49).
A maioria das instituições empresariais continua a não apresentar tolerância ou solidariedade às deficiências, desconhecendo o potencial que pessoas com deficiência podem apresentar e ainda não respeitando a legislação vigente que obriga instituições de maior3 porte a contratarem pessoas com deficiência.
Tanaka e Manzini (2005) afirmam que pesquisas deixam claro que os empresários acreditam que a maior dificuldade na contratação de pessoas com deficiência esteja nas próprias pessoas:
Pelas limitações da deficiência; nas instituições que as atendem, na medida em que afirmam que as oficinas desenvolvidas nelas não preparam a pessoa com deficiência para a realidade do mercado; na arquitetura e transporte urbano, pois elas não conseguem chegar à empresa. Porém, ficou evidente durante as entrevistas que as empresas: esperavam encontrar a pessoa com deficiência já treinada e preparada; não abriam mão das exigências que realizavam para os trabalhadores sem deficiência (experiência, escolaridade,etc); contratavam apenas pessoas que possuíam deficiências que não necessitassem de mudanças arquitetônicas; e esperavam que a pessoa se adaptasse à função, pensando até mesmo em mecanismos de “criar” funções a serem exercidas, sem se importar em adaptar a função à pessoa com deficiência (TANAKA e MANZINI, 2005, p.123).
Outra perspectiva é trazida por Rosa (2009) para quem, sejam empresas públicas ou estatais, não há interesse na política inclusiva e mesmo naqueles casos minoritários, onde a empresa contrata pessoas com deficiência, o processo de seleção, contratação e adaptação acaba sendo estruturado para atender apenas alguns tipos de deficiência. Sobre isto, se argumenta:
As empresas preferem contratar pessoas cujas características as aproximam mais do padrão dos demais funcionários e evitam despesas com adaptações de qualquer natureza. Em última instância, esses processos de contratação devem satisfazer as exigências das empresas de “extrair o máximo de trabalho, de produtividade e de lucro” (Rosa, 2009, pag. 16) e os trabalhadores contratados nesses processos devem adaptar-se ao posto de trabalho submetendo-se, inclusive às regras da competição, as quais selecionam os mais produtivos e eliminam os inaptos ou improdutivos. (Rodrigues ,2011, p.49).
Falta, portanto, na maioria dos casos programas específicos para contratação de pessoas com deficiência, assim como políticas internas que promovam o debate em torno da inclusão, assim como fiscalizações rigorosas em empresas que participam da cota a pessoa com deficiência, assim não só visando o lucro, mas ao incentivo para maiores contratações, com incentivos fiscais e de responsabilidade social. Os representantes das empresas não podem permanecer passivos diante das questões que envolvem as pessoas com deficiência.
4.1 CONTRATO DE TRABALHO E RELAÇÃO DE EMPREGO NO BRASIL
A sociedade precisa posicionar-se melhor diante da questão, pois ela é responsável pela construção de práticas e de instituições mais inclusivas, devendo lutar por processos seletivos que respeitem as diversidades e que possibilitem que pessoas com deficiência tenham um acesso mais facilitado ao mundo do trabalho.
Garcia (2010) afirma que há, pouco mais de 6 milhões de pessoas com deficiência que possuem idade para trabalhar. No ano de 2009 0,7 do total de 41,2 milhões de brasileiros que estão empregados eram pessoas com deficiência, em torno de 288,6 mil pessoas. No ano de 2008, porém, eram cerca de 323.200 pessoas com algum tipo de deficiência empregados, o que demonstra a diminuição do acesso ao mercado de trabalho por essas pessoas. O gráfico 1 representa a evolução do número de pessoas com deficiência contratadas no brasil de 2007 a 2013.
Observe: Figura 1

Gráfico 1: Pessoas com deficiência empregadas de 2007 a 2013 Fonte: Schwarz e Haber (2014)
Pode se afirmar que:
É importante notar que a queda significativa dos trabalhadores com deficiência no mercado de trabalho formal se deu mesmo com o aumento da fiscalização e consequentes multas aplicadas por parte do MTE, demonstrando que as ações atuais vêm sendo insuficientes para senão aumentar, ao menos manter nos patamares dos anos anteriores. Prova disso são os dados apresentados pela Secretaria de Inspeção do Trabalho. Segundo relatório estatístico, o número de autos de infração lavrados por conta do não 51 cumprimentos da lei de cotas (lei 8.213/91) saltou de 336 em 2005 para 1.167 em 2010 (54), sendo que o número de pessoas com deficiência que tiveram vínculo de trabalho registrado devido à ação fiscal também aumentou nos últimos três anos: dados do MTE indicam que em 2008, 2009 e 2010 foram respectivamente de, 25.844, 26.449 e 28.752 (5633, 5734,5835). Assim, enquanto nos últimos anos, a fiscalização, consequentemente autos de infração e registro de pessoas com deficiência mediante ação fiscal evoluem, o número de pessoas com deficiência trabalhando no mercado formal diminuem, exceto no ano de 2010. (Rodrigues,2011, p.50).
Quase uma década depois, em 2018 houve cerca de 486 mil pessoas com deficiência com empregos formais no país, cerca de 1% das ocupações do mercado formal. Em 418 mil pessoas com deficiência empregadas em 2016 e 441 mil em 2017, o que deixa claro que a situação tem melhorado, mesmo que em passos lentos. Para Santos Neto (2020, p.01) “o crescimento está relacionado com o aumento da fiscalização dos órgãos públicos sobre as empresas, mas também com uma melhor definição das regras da Lei de Cotas a partir de 2015” quando foi promulgado o Estatuto da Pessoa com Deficiência.
O gráfico 2 traz uma referência sobre os tipos de pessoas com deficiência contratados pelo mercado de trabalho:
Figura 2:

Gráfico 2: tipos de pessoas com deficiência contratadas no mercado de trabalho Fonte: Schwarz e Haber (2014)
Observa-se que a maior parte dos contratados no mercado de trabalho são pessoas com deficiência auditiva (61%), seguidos da deficiência mental ou intelectual (27%), deficiência física (8%) e deficiência visual (3%). Logicamente esses dados podem variar pelo tipo de instituição, pois determinado tipo de deficiência poderá encaixar-se com mais facilidade no perfil e nas necessidades da empresa.
Em dados numéricos, o gráfico 3 demonstra que são 175 mil deficientes físicos, 73 mil deficientes surdos, 22 mil deficientes cegos e 4 mil com mais de uma deficiência. São cerca de 30 milhões de pessoas com deficiência em idade para trabalhar e apenas 330 mil com carteira assinada (CUT, 2014).
Figura 3:

Gráfico 3: Número de pessoas com deficiência empregadas Fonte: Schwarz e Haber (2014)
Diante de todo esse contexto apresentado, as leis 10.048, 10.098, 8.112, 8.213 e o Decreto 5.296 são vistas como de grande importância para que o poder público consiga promover uma maior inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, mesmo que isto encontre barreiras nas instituições e na política de constante busca por lucros.
As reflexões sobre como é difícil a inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho brasileiro, onde mesmo com mais de 20 anos da lei de cotas, há inúmeros desafios que precisam ser vencidos. Segundo o autor:
No Brasil, toda empresa com 100 funcionários ou mais é obrigada por lei a ter de 2% a 5% dos seus cargos preenchidos por pessoas com deficiência. É o que prevê o artigo 93 da Lei nº 8.213/91, também conhecida como Lei de Cotas, que apesar de seus quase 30 anos ainda não é plenamente cumprida. Em se tratando de mercado de trabalho, as pessoas com deficiência ainda enfrentam muitos desafios. (Santos Neto, 2020).
Há um desconhecimento por parte da grande maioria da população sobre a legislação existe e a falta de conhecimento das pessoas acaba inibindo a adesão das empresas aos programas de inclusão. A existência de cotas é tratada como um passo importante para a diminuição do preconceito e para uma maior aceitação das pessoas com deficiência, assim como acontece com o esporte paraolímpico e com as inúmeras lutas por acessibilidade. Afirma-se:
Os resultados da pesquisa [...] mostraram que ainda existe desconhecimento por parte desses gestores e profissionais de RH em relação à legislação. Além disso, a inserção de pessoas com deficiência no setor é vista por eles como um dificultador. A maioria relata que elas devem ser inseridas na área administrativa. Os principais fatores que contribuem para isso são as barreiras arquitetônicas (a falta de adaptação dos espaços físicos, muito comum em sedes industriais mais antigas) e as próprias características de risco do setor, como a presença de altas temperaturas ou o uso de maquinário pesado. A pesquisa também constatou que há escassez de treinamento para os profissionais em relação à inserção e manutenção das pessoas com deficiência na empresa. (Santos Neto,2020, p. 01)
Muitas pessoas com deficiência pelas dificuldades encontradas em adentrar ao mundo do trabalho acabam não tendo a qualificação que a empresa deseja e isto aumenta as dificuldades. São, portanto, diferentes fatores que geram a situação de dificuldade crônica que o indivíduo com deficiência encontra de adentrar no mercado de trabalho brasileiro, conquistando sua autonomia e maior dignidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo tem como finalidade de mostrar as repercussões da lei 13.146 de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), assim respondendo a problemática, a inserção da pessoa com deficiência dentro dos contratos de trabalho ainda vem enfrentando desafios para que estas pessoas sejam inseridas de forma que sejam amparadas pela lei e pelas empresas para que se possam sentir socialmente incluídas e autossuficientes para o trabalho, trazendo o seu sustento e se o sentimento de utilidade para a sociedade. Como a existência da lei de cotas que gerou reflexos jurídicos de grande benefício, que garante o direito do indivíduo com deficiência de ter acesso ao mercado de trabalho, porém, sua simples existência não impede que a prática da questão envolva inúmeros desafios que precisam ser vencidos para que a inclusão efetivamente venha a acontecer. Há de se considerar ainda que apenas inserir a pessoa com deficiência na instituição não efetiva a inclusão, é preciso que ela seja qualificada, que espaços de trabalho sejam adaptados para que seu potencial seja aproveitado de forma mais produtiva.
As instituições empresariais continuam negligenciando as obrigações que tem de oferecer cotas a esses indivíduos e ainda limitam aquelas oferecidas a determinados tipos de deficiência. Permanece ainda o preconceito e a exclusão e para o deficiente, não poder trabalhar, não colocar em prática suas potencialidades ainda é reflexo de toda a história vivenciada por eles, marcada por exclusão, preconceito e falta efetivação dos direitos.
Nesse sentido, conclui-se que apesar de todos desafios enfrentados pela pessoa com deficiência no mercado de trabalho, a lei 13.146/2015, além da lei de cotas trouxe grandes avanços e dados positivos, são 400.000 mil brasileiros empregados formalmente, menos de 1% das pessoas empregadas formalmente no pais, isso já é uma vitória para estas pessoas que buscam a igualdade e cada vez mais diminuindo o preconceito e as barreiras enfrentadas por eles. Porem há ainda muito o que ser feito para que estes números sejam maiores e de grandes avanços nos contratos de trabalho, por que o número de pessoas com deficiência desempregados ainda e alto, cerca de mais de 6% da população tem algum tipo de deficiência, dados esse fornecidos pelo IBGE.
Não há dúvidas de que um dos maiores desafios a serem vencidos pela Política Nacional de Saúde do Brasil refere-se às questões ligadas ao trabalho, pois mesmo havendo vários instrumentos legislativos que incentivam, assim como amparam a empregabilidade da pessoa com deficiência, ingressar no trabalho é algo não apenas difícil, mas em muitos casos, até mesmo impossível para muitas pessoas com deficiência.
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Notas:
2 As ações afirmativas surgiram nos Estados Unidos em meados da década de 60, a partir das lutas pelos direitos civis dos negros, com o objetivo inicial de garantir leis anti-segregacionistas. No entanto, a existência dessas leis não era garantia de que os negros passariam a fazer parte da sociedade, assim, as ações afirmativas surgiram como postura ativa do Estado em busca da melhora de condições de vida da população negra (RODRIGUES, 2011, p.46).
3 A reserva de vagas irá depender do número total de empregados da empresa, por exemplo, de 100 a 200 empregados precisa reservar 3% de suas vagas para pessoas com deficiência, instituições com mais de 1000 empregos, devem reservar cerca de 5% desses cargos para pessoas com deficiência (BRASIL, 1991).
Fonte: JornalJurid