Patrimônio Público
Nepotismo: MP propõe ação de improbidade contra prefeito afastado de Luziânia e mais 4 pessoas
por Cristiani Honório - MPGO
quinta-feira, 08 de outubro de 2020, 13h45
O Ministério Público de Goiás (MP-GO) propôs ação civil pública por ato de improbidade administrativa, com pedido cautelar de indisponibilidade dos bens e afastamento do cargo público, contra o prefeito afastado de Luziânia, Cristóvão Vaz Tormin, o vereador Boaz Epaminondas Albuquerque e servidores em situação de nepotismo. Os servidores são Sammael Vieira de Albuquerque, Sara Dias Vieira de Albuquerque e Marcos Wendell Roriz Calixto.
O objetivo é a condenação dos acionados pelos ilícitos praticados, nas sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa e a condenação ao pagamento de dano moral coletivo, no valor apontado de R$ 100 mil.
Nepotismo
Na ação, é relatado que a 6ª Promotoria de Justiça de Luziânia tem recebido, nos últimos anos, inúmeras denúncias de nepotismo envolvendo o prefeito afastado e outras autoridades, tanto que foram abertos mais de cem procedimentos de investigação sobre a questão. Um deles, instaurado em abril do ano passado, constatou a prática de nepotismo e manutenção em cargos comissionados dos servidores Marcos Wendell, Sara Dias, Sammael Vieira e Boaz Epaminondas, que são, respectivamente, genro e filhos do vereador Boaz. Na época, o político era aliado e integrante da base de apoio de Cristóvão Tormin, contrariando a Súmula Vinculante n° 13, do Supremo Tribunal Federal, que veda a prática.
Caso a caso
Em relação a Sammael Vieira, apurou-se que ele ingressou na administração pública em março de 2017, sendo nomeado por Cristóvão Tormin como assessor de planejamento na Secretaria de Saúde. Ouvido pelo MP-GO, o servidor foi contraditório, sobretudo em relação a seu cargo. Inicialmente, afirmou ser assessor de planejamento, depois disse que chefiava um posto de saúde no cargo de diretor administrativo, fato confirmado pelo seu pai, estando assim, também, em desvio de função. Apesar de reconhecer que não tem qualificação técnica na área, foi contratado em razão de sua proximidade com o prefeito afastado, o que foi negado por Tormin. O salário de Sammael é de, aproximadamente, R$ 2,5 mil.
Sobre Sara Dias, a promotoria local constatou que ela entrou no serviço municipal em fevereiro de 2018, por credenciamento celebrado com a Unidade de Assistência à Saúde dos Servidores Públicos Municipais de Luziânia (Ipasluz Saúde) para o cargo de odontóloga. Em depoimento, alegou que sua contratação não teve nenhuma influência do seu pai, conseguindo-a apenas com a entrega de currículo ao então superintendente da unidade, o que foi confirmado pelo ex-gestor. Sara foi contratada por R$ 23.100,00, em 11 parcelas de R$ 2.100,00, de fevereiro a dezembro de 2018. Posteriormente, foi feito um aditivo no mesmo valor para o período de janeiro a novembro de 2019.
Quanto a Marcos Wendell, verificou-se que ele foi contratado em agosto de 2018. Casado com Sara Dias, filha do vereador, ele foi beneficiado com a influência do sogro e sua proximidade com o prefeito afastado. Ainda vinculado ao município, recebe R$ 1.800,00.
Desfecho do inquérito
Após as investigações, o MP-GO chegou a recomendar ao prefeito, em abril de 2019, a exoneração de diversos servidores enquadrados em situação de nepotismo e desvios de finalidade. Transcorridos os dez dias fixados no documento, nenhuma das providências foi adotada, motivando a propositura da ação.
Violações
Na ação, o MP-GO sustenta que ficou configurado o nepotismo por vínculo político, desvio de finalidade e de função no caso de Sammael, e por violação aos princípios constitucionais, pela não realização de concurso público e pelas contratações de Sammael e Marcos Wendell não atenderem as hipóteses de caráter temporário e excepcional. Quanto à requerida Sara, sua contratação também não foi realizada em virtude de situação emergencial. A contratação foi feita sem nem mesmo um processo seletivo, uma vez que uma das testemunhas informou que nunca fora realizado concurso público para provimento de cargos no Ipasluz-Saúde. “Portanto, tem-se que a escolha dos profissionais é feita mediante análise superficial dos currículos apresentados, inexistindo especificação quanto ao critério de escolha, evidenciando a discricionariedade do ato”, observa a ação.
No que se refere ao princípio da impessoalidade, a promotoria ressalta que o provimento de cargos comissionados deve ser feito em razão da competência do candidato, mediante critérios igualitários de seleção para a vaga oferecida, em prestígio à ideia de meritocracia, o que não ocorreu no caso dos acionados.
Com relação ao princípio da moralidade, o argumento do MP salienta que esse preceito “nada mais é que a atuação do gestor público em consonância com os mandamentos éticos e legais, tendo o objetivo de atender ao interesse público. A concessão de benefícios profissionais em favor de um servidor público, por força de suas relações de parentesco com agentes políticos, contraria um sentimento ético presente na sociedade”.
Para o MP-GO, maculou-se também o princípio da eficiência, na medida em que não foi buscado o resultado mais efetivo para a administração pública.
Indisponibilidade de bens
Ao indicar o valor de bens a serem colocados em indisponibilidade, a ação pontua que, considerando o patamar fixado na Lei de Improbidade Administrativa, deve-se bloquear até cem vezes o valor da remuneração recebida pelos requeridos, o que perfaz a quantia de R$ 4.370.000,00, acrescidos de R$ 100 mil a título de dano moral coletivo.
Desta forma, foi requerido o bloqueio de R$ 2,6 milhões dos bens de Cristóvão Tormin relativo à multa civil de cem vezes o valor de sua remuneração, e indisponibilidade de R$ 1.130.000,00 dos bens do vereador Boaz), relativo à multa civil de cem vezes o valor de sua remuneração.
Já para Sammael Vieira foi pedido o bloqueio total do valor de R$ 357.500,00, sendo R$ 107.500,00 por dano ao erário e R$ 250 mil de multa civil de cem vezes o valor de sua remuneração. Quanto a Sara Dias, foi requerido bloqueio total R$ 256.200,00, sendo R$ 46.200,00 por dano ao erário e R$ 210 mil de multa civil de cem vezes o valor de sua remuneração.
Por fim, pediu-se o bloqueio de bens de Marcos Wendell em R$ 226.800,00, sendo R$ 46.800,00 pelo dano ao erário e R$ 180 mil de multa civil de cem vezes o valor de sua remuneração.
Afastamento
O MP-GO pediu também o deferimento de liminar para determinar o imediato afastamento dos três servidores em situação de nepotismo, com prejuízo dos vencimentos, proibindo-se, ainda, o exercício por eles de qualquer cargo comissionado no âmbito da administração direta, indireta ou fundacional da prefeitura de Luziânia. Foi pedido ainda o afastamento do vereador Boaz de suas funções no Legislativo municipal.
Dano moral coletivo
No processo, é destacado que, além da violação aos princípios administrativos, os requeridos devem ser condenados ao pagamento de indenização quanto ao dano extrapatrimonial causado à coletividade. Segundo argumentado, a Lei 7.347/85 é expressa ao prever a responsabilização por danos morais causados, dentre outros, ao patrimônio público e social. No caso dos autos, o ato de improbidade administrativa praticado pelos requeridos gerou danos patrimoniais e morais, com afronta aos princípios da impessoalidade e da moralidade, bem como a burla explícita ao concurso público, ensejando a condenação pelos danos morais coletivos.
Fonte: MPGO