Ministério Publico do Estado de Mato Grosso

Como o planejamento urbano pode tornar os alimentos mais acessíveis

sexta-feira, 03 de outubro de 2025, 15h46

Produção local de alimentos saudáveis pode ser a chave para desviar da inflação; estudo inédito analisa dados de Curitiba

 

Vista aérea da horta comunitária Vitória Régia, em Curitiba. | Foto: Daniel Castellano / SMCS

Frequentemente, as hortas urbanas de Curitiba são destaque no CicloVivo. A capital do Paraná é referência no incentivo ao plantio urbano e compartilhado – tendo criado inclusive a primeira “fazenda urbana” do país. Há diversos benefícios de investir na agricultura urbana, mas um estudo inédito traz um dado bastante interessante e ainda pouco explorado: o impacto do planejamento urbano e regional na produção local e acessível de alimentos saudáveis.

 

O olhar integrado para os desafios e o potencial da produção, transporte, comercialização, acesso, consumo e descarte de alimentos no âmbito local e regional é uma forma eficaz e duradoura de se combater a inflação dos alimentos que tem impactado as famílias brasileiras. É o que mostra o estudo inédito “Os caminhos da comida: o papel do planejamento urbano na transformação do sistema alimentar” que analisou dados dos municípios de Curitiba, Região Metropolitana e Litoral Paranaense e revelou que os municípios apresentam potencial para realizar a transição para sistemas alimentares mais sustentáveis e saudáveis com a contribuição de políticas de planejamento urbano.

 

Caminhos para serem mais sustentáveis e as ações a serem adotadas para servir de exemplo para outras cidades do país também estão apresentados em uma série de recomendações na pesquisa, fruto de uma parceria entre o Instituto Escolhas, o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC) e a Secretaria Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional (SMSAN) da Prefeitura Municipal de Curitiba.

 

Horta Marumbi, em Curitiba. | Foto: Valdenir Daniel Cavalheiro | Copel

 

A Região Metropolitana de Curitiba e o Litoral produziram, em 2022, o suficiente para alimentar 3,5 milhões de pessoas, quase toda a população da região (3,9 milhões de habitantes). Cerca de 1 a cada 3 alimentos comercializados na Ceasa Curitiba é oriundo da RMC e do Litoral, o que indica um potencial de estruturação de cadeias curtas de distribuição de alimentos na região. A produção e comercialização próxima ao consumidor possibilita a redução do desperdício de alimentos e das emissões de CO2, além de estimular a geração local de emprego e renda.

 

Hortas em Curitiba

Curitiba já é referência em políticas de fomento a produção local de alimentos. Hoje, somente na capital paranaense, são 190 hortas urbanas, sendo 85 escolares, 53 comunitárias e 52 institucionais, que beneficiam mais de 39 mil pessoas. Uma das recomendações do estudo é que gestores e planejadores incentivem o uso sustentável de espaços urbanos e periurbanos ociosos para práticas agrícolas como forma de preservar áreas verdes, estimular segurança alimentar e utilizar terrenos vazios. Curitiba, por exemplo, possui 1.506 hectares de espaços potenciais – sem utilização, livres de edificação e vegetação – para a expansão da produção sustentável de alimentos.

 

Hortas urbanas sob linhas da Copel em Curitiba. Foto: Valdenir Daniel Cavalheiro | Copel

 

Para Jaqueline Ferreira, Diretora de Pesquisa do Instituto Escolhas, pelo seu caráter estratégico, a produção de alimentos na metrópole deve ser uma agenda prioritária para a gestão pública. “A maior parte da população brasileira mora nos centros urbanos. Investir na produção de comida nas metrópoles nos ajuda a enfrentar questões urgentes como a inflação dos alimentos, a insegurança alimentar, a geração de emprego e renda, e o enfrentamento da emergência climática”, diz Ferreira. “No momento em que a inflação assusta os brasileiros, para a comida ficar mais barata no mercado da esquina, é preciso que o Brasil apoie e invista na produção mais perto do consumidor”, complementa.

 

Ao mesmo tempo que tem experiência para compartilhar com o resto do país, a RMC e o Litoral também têm desafios a enfrentar, como mostra a pesquisa. Houve uma redução da produção de alimentos importantes para a segurança alimentar como o feijão, cuja área plantada teve queda de 35% (de 48,8 mil hectares para 31,7 mil hectares). Enquanto isso, a soja registrou aumento de 161% de área plantada entre 2012 e 2022, que passou de 67 mil hectares para 174,6 mil hectares. A pesquisa revelou ainda uma queda expressiva no número de estabelecimentos agropecuários da agricultura familiar, cerca de 25%, e redução de 9% da área, 21 mil hectares a menos para a agricultura familiar, entre 2006 e 2017, além de constatar o envelhecimento dos produtores.

 

Segurança alimentar

O estudo mostra que o percentual da população em situação de segurança alimentar na Região Metropolitana de Curitiba é superior à média brasileira, que é de 70, 3%. Curitiba e a região metropolitana registram, respectivamente, 80,9% e 79,6%, da população em segurança alimentar – com acesso pleno e regular aos alimentos. Mas, a situação de insegurança alimentar grave na RMC ainda é preocupante entre determinados grupos populacionais como idosos, mulheres, pessoas pardas, pretas, amarelas e indígenas.

Horta Urbana no Bairro da Caximba, em Curitiba. Na imagem Edmilson Gomes Xavier um dos hortelões da horta. Foto: Daniel Castellano | SMCS

 

Segundo Elizandra Araujo de Oliveira, gerente do setor socioeconômico do Ippuc, é preciso comemorar aspectos positivos identificados na pesquisa, resultado de políticas públicas locais de promoção da alimentação saudável, e trabalhar para colocar em prática as recomendações do estudo.

 

“Esse estudo vai contribuir para avançarmos com políticas de planejamento urbano que estejam integradas ao desafio da promoção da segurança alimentar e nutricional, prioritariamente, ampliando a oferta e principalmente o acesso aos alimentos com foco nos territórios com maiores índices de vulnerabilidade social. Por exemplo, com o mapeamento das áreas prioritárias para expansão da rede de equipamentos de SAN é possível agilizar e facilitar o acesso das famílias que mais precisam.”

 

Caminhos a seguir

O estudo, que reforça as relações entre o planejamento urbano e a alimentação saudável, traz recomendações para que Curitiba, Região Metropolitana e Litoral se tornem mais sustentáveis e que ações possam servir de exemplo e estender para outras cidades do país. Alguns caminhos: garantir políticas públicas que fortaleçam a agricultura urbana e ampliem o acesso à alimentos saudáveis em áreas de maior vulnerabilidade social e incentivar práticas agroecológicas e sistemas agroflorestais, inclusive como estratégia de regeneração de Áreas de Preservação Permanente degradadas são algumas das recomendações do estudo.

 

Agricultores urbanos na Horta comunitária Vitória Régia | Foto: Daniel Castellano / SMCS

 

Além das ações acima destacadas, gestores podem adotar instrumentos de promoção da função social da propriedade, como o incentivo à expansão da agricultura urbana em áreas privadas, em especial nos terrenos ociosos. Ou o uso de outros instrumentos de política urbana, como o que permite ao município adquirir áreas estratégicas para instalação de equipamentos de segurança alimentar (feiras, restaurantes, mercados e sacolões populares, hortas urbanas) pode integrar o planejamento dos municípios.

Confira o estudo na íntegra.

 

Fonte: Ciclo Vivo

 


topo