Cascata de problemas
domingo, 09 de julho de 2006, 00h00
Folha de São Paulo (Foto:Ednilson Aguiar Secom-MT)
O primeiro problema apontado pelo Ministério Público envolve a própria competência de Mato Grosso para licenciar a hidrelétrica, já que o rio Aripuanã é federal -corta dois Estados-, o que daria ao Ibama, o órgão ambiental federal, essa responsabilidade.
Há conflito com o Ibama também num fato aparentemente ignorado pela Eletronorte: a zona dos saltos foi classificada pelo Ministério do Meio Ambiente como de prioridade "extremamente alta" para a conservação da biodiversidade, e o Ibama estuda a criação, ali, de uma reserva de desenvolvimento sustentável.
Outro ponto nebuloso diz respeito ao valor das linhas de transmissão, que ainda geram debate.
Mas a principal confusão é quanto À vazão mínima necessária para fazer funcionar a hidrelétrica e manter as cachoeiras com água. A primeira versão do EIA-Rima fala em 12 metros cúbicos por segundo de vazão remanescente (ou seja, descontando o que a usina utilizará). O valor depois foi alterado para 17,9 metros cúbicos por segundo e, agora, para 21.
Acontece que, para funcionar, a hidrelétrica precisa de pelo menos 17 metros cúbicos por segundo. E a vazão mínima mensal do rio Aripuanã é 18 metros cúbicos por segundo. Não bastasse isso, uma portaria da Agência Nacional das Águas estabelece que as pequenas centrais hidrelétricas já instaladas no salto dos Dardanelos devem ter garantidos 24,3 metros cúbicos por segundo.
Por essa matemática, a hidrelétrica só poderia funcionar quando o rio tivesse mais de 60 metros cúbicos por segundo de vazão. "Pelos nossos cálculos, a usina ficaria três meses por ano parada por falta d'água -isso se a vazão remanescente fosse 12 metros cúbicos por segundo", diz Dorival Gonçalves Júnior, professor de engenharia elétrica da Universidade Federal de Mato Grosso e um dos especialistas que analisaram o EIA-Rima a pedido do MP. "Se você viabiliza os 21 metros cúbicos, inviabiliza a usina do ponto de vista energético, e vice-versa."
Segundo Gonçalves Júnior, a inconstância do rio faria com que a chamada energia firme da usina -ou seja, a potência com a qual se pode contar- caísse para 80 megawatts, o que a Eletronorte nega. A potência instalada (nominal) do empreendimento é 261 megawatts. "Nacionalmente, para uma usina ser economicamente viável, essa relação é acima de 50%", diz o engenheiro. "Isso vira tarifa depois."
 Com Juliana Arini, colaboração para a Folha