Após pedido do MP, juíza suspende abertura de licitação para serviços de água e esgoto em Goianésia
por MPGO
terça-feira, 27 de outubro de 2020, 15h49
Acolhendo parcialmente pedido feito pelo Ministério Público de Goiás (MP-GO), a juíza Ana Paula de Lima Castro determinou a suspensão da sessão de abertura do procedimento licitatório convocado pelo município de Goianésia para a concessão da prestação de serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário. O Edital nº 3/2020, cuja sessão de abertura aconteceria na manhã desta segunda-feira (26/10), prevê um valor de quase R$ 170 milhões para o contrato.
Na decisão, a magistrada definiu que sejam estabelecidos novos prazos para que todos os licitantes (interessados) possam realizar visita técnica prevista no edital. De acordo com a juíza, apesar de não poder ser desconsiderada a atipicidade trazida pela pandemia do novo coronavírus, o prazo de 10 dias para visita técnica estipulado no edital poderia limitar a ampla concorrência, tão necessária para que a administração pública obtenha a proposta mais vantajosa. Para ela, a limitação da participação de mais empresas no procedimento licitatório em razão do exíguo tempo para realizarem a visita técnica pode levar à violação ao princípio da competitividade.
A medida foi deferida em ação cautelar proposta pela promotora de Justiça Márcia Cristina Peres, que esclareceu nos autos que a promotoria recebeu informações anônimas de que o prefeito Renato Menezes de Castro publicou a abertura de licitação, na modalidade concorrência, prevendo que a sessão pública aconteceria às 9 horas desta segunda-feira (26/10). A promotora foi noticiada ainda que a Presidência da Comissão de Licitação, em 2 de setembro, publicou um aviso de prorrogação do certame, mas não fez a previsão de data para sua retomada. A licitação, no entanto, voltou a seu curso normal sem a publicação de novo aviso e sem alteração da data para realização da sessão pública, sendo divulgado apenas o edital retificado.
Foi apurado ainda que o edital prevê o valor estimado do contrato em R$ 167.593.869,00, valor a ser usado no investimento em infraestrutura de água e esgoto, prevendo um prazo de concessão de 35 anos, contados da data de emissão da ordem de serviço, sem prejuízo das disposições legais.
Inquérito civil
Além do pedido de suspensão da sessão da licitação, por meio de ação cautelar, a promotora instaurou inquérito civil público para apurar os fatos. A reclamação feita ao MP também foi encaminhada ao Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), informando a existência de várias irregularidades no edital, anotando-se que outras impugnações foram endereçadas à Comissão de Licitação, inclusive pelo Conselho Regional de Química e pela Saneago.
Visita obrigatória
Márcia Peres observou que apenas a justificativa de complexidade da obra não é argumento suficiente a exigir a visita pessoal antes da sessão pública e que a medida limita o caráter competitivo do certame, maculando o princípio da livre concorrência, em razão da natureza e valor econômico da negociação. Para ela, essa exigência deve estar acompanhada da justificativa, indicando quais as especificidades do objeto levam à necessidade de adoção obrigatória da providência pois “caso contrário, a previsão se torna limitadora, podendo acarretar prejuízo à competitividade”.
Ainda com relação a essa questão, a promotora apontou que o edital fixou que as visitas às áreas de concessão e às instalações existentes serão realizadas entre a data de sua publicação até um dia antes da realização do certame, em conjunto com um representante da prefeitura e mediante agendamento a ser realizado com dois dias de antecedência da data desejada para a visita.
A promotora destacou que, uma vez que o edital foi publicado na primeira quinzena de setembro, e, sendo a sessão pública designada para o dia 26 de outubro, os interessados teriam 40 dias para a visita técnica obrigatória, sob pena de desclassificação, e para elaborar sua proposta de preços, não tendo sido tal prazo cumprido, em razão de desentendimentos administrativos entre a prefeitura e a Saneago.
A promotora de Justiça considerou ainda, ao iniciar a investigação, o fato de que o município, quase um mês depois de aberto o prazo para a visita obrigatória prevista no edital, propôs ação cautelar contra a Saneago, sob alegação de que a empresa não estava permitindo que fosse realizada visita técnica à área de concessão pelos licitantes. Somente após a ação, a autorização foi concedida, mas a Saneago somente o fez no dia 15 de outubro. Nesta data, foi juntada ao processo uma petição da Procuradoria Jurídica do município informando novamente a impossibilidade de realização das visitas. Desta forma, o prazo de 40 dias para as visitas ficou reduzido a menos de 10 dias, impossibilitando o cumprimento da exigência do edital.
Contrato milionário
Por fim, a promotora questionou o interesse público que justificaria o fato de administração pública, nos dias finais de mandato, assumir um compromisso de tamanha envergadura, assinando um contrato milionário para que seja cumprido pelo próximo gestor, a quem caberia, junto com sua equipe, analisar a conveniência ou não de continuar o processo de parceria público-privada.
Na portaria de instauração do inquérito, Márcia Peres afirmou que, uma vez comprovadas as irregularidades na licitação, a violação, em tese, dos princípios constitucionais que regem a administração pública, tais como a legalidade e a moralidade, estaria caracterizada, o que constitui ato de improbidade administrativa.
FONTE: MPGO